disseram que não parecia triste, mas que a luz do sol o
atravessava como se fosse feito de vidro. o homem era
para alguns invisível e um fantasma para outros. nunca
falava, mas contavam que tinha sido visto a discutir com
os pardais. também não se lhe conhecia outra roupagem
que não fossem poemas. saía à rua vestido com versos e
depois ficava sentado nos bancos dos jardins. ninguém
o lia. e alguém me disse que vivia assim porque deixara
de escrever, desde o dia em que tinha perdido um amor.
28 setembro 2015
[ inevitável na noite de hoje, um azul sobre a lua ]
It is a brand new moon, since two men walked up there
Yes, we got a brand new moon, since the two men they walked
up there
But it's the same old world for us. babe, you know we ain't
goin nowhere
They got all of that bread, just to send people into space
You know they got all of that bread, just to send people up
in space
But there's trouble there for us, baby we aint goin any
place
I saw a flag on the moon, and I was just as proud as I could
be
I saw a flag on the moon, and I was just as proud as I could
be
You know, I love my country, baby, but my country dont love
me
Ooh ooh ooh, you know I just got the moon blues
Yes, I said ooh ooh ooh, peoples I just got the moon blues
Cause all we got down here on earth, babe, I think we might
as well go to the moon
27 setembro 2015
Ya no seré feliz. Tal vez no importa.
Hay tantas otras cosas en el mundo;
un instante cualquiera es más profundo
y diverso que el mar. La vida es corta
y aunque las horas son tan largas, una
oscura maravilla nos acecha,
la muerte, ese otro mar, esa otra flecha
que nos libra del sol y de la luna
y del amor. La dicha que me diste
y me quitaste debe ser borrada;
lo que era todo tiene que ser nada.
Sólo que me queda el goce de estar triste,
esa vana costumbre que me inclina
al Sur, a cierta puerta, a cierta esquina.
Jorge Luis Borges
26 setembro 2015
nemo portrait / self-portrait
mary britton clouse
25 setembro 2015
d e s c u b r a a s s e t e d i f e r e n ç a s :
o terceiro planeta vai descrevendo a sua trajectória elíptica em redor
da pequena estrela e afasta-se definitivamente. a estação do ano mudou. gosto
do outono, do tempo a arrefecer e das cores das folhas. lembrei-me de vivaldi
mas logo a seguir ocorreram-me as estaciones porteñas de piazzolla. descobre as
diferenças do otoño cantado
a) pelo bandoneón de astor
b) pelo violino de arabella
24 setembro 2015
De que
serviria
Aquilo que
somos não é aparente,
não podemos
explicar o sofrimento
de onde
procede este amor.
Mas eu não
vim para te dizer
como as
sombras mistificam
o mundo: não
me perguntes nada.
Tu já és a
causa por detrás da máquina
dos dias, se
eu for por essa terra fora
será para
chamar por ti.
Rui Pires Cabral
23 setembro 2015
só hoje termina o verão mas parece-me ter passado há muito tempo. do magnífico e intemporal "from gardens where we feel secure", recordarei sempre aqueles momentos bucólicos de encantamento infantil que virginia astley me proporcionou na adolescência - não o sabia então, mas era já um pouco de céu na terra.
22 setembro 2015
[artista desconhecido]
c.a.m. da f.c.g.
fábula do destino
numérico
assim que o espelho caiu no frio chão de pedra
e se estilhaçou em mil e um pedaços brilhantes
pensou nos sete anos de azar que lhe estavam
desde logo destinados. e maldisse essa injusta
falta de sorte, não ter ali à mão mais dezanove
espelhos que pudesse deixar cair, um após outro,
até ao fim: sempre viveria até aos cento e quarenta.
21 setembro 2015
eddie james “son” house, jr. é autor de uma das grandes
epifanias dos azuis. cresceu num ambiente religioso e ainda adolescente iniciou
uma carreira de pregador nas igrejas baptista e metodista episcopal. o seu
inimigo preferido era a música, para ele um sinónimo de degenerescência moral e
perdição eterna. mas diz-se que aos vinte e cinco anos teria ouvido alguém
tocar bottleneck slide guitar, num
estilo para ele até então desconhecido, o que o levou a comprar uma guitarra. nesse
dia perdeu-se um pregador... e o resto é história.
I
got a letter this mornin, how do you reckon it read?
It
said, "Hurry, hurry, yeah, your love is dead"
I
got a letter this mornin, I say how do you reckon it read?
You
know, it said, "Hurry, hurry, how come the gal you love is dead?"
So,
I grabbed up my suitcase, and took off down the road
When
I got there she was layin' on a coolin' board
I
grabbed up my suitcase, and I said and I took off down the road
I
said, but when I got there she was already layin on a coolin' board
Well,
I walked up right close, looked down in her face
Said,
the good ol' gal got to lay here 'til the Judgment Day
I
walked up right close, and I said I looked down in her face
I
said the good ol' gal, she got to lay here 'til the Judgment Day
Looked
like there was 10,000 people standin' round the buryin' ground
I
didn't know I loved her 'til they laid her down
Looked
like 10,000 were standin' round the buryin' ground
You
know I didn't know I loved her 'til they damn laid her down
Well,
I folded up my arms and I slowly walked away
I
said, "Farewell honey, I'll see you on Judgment Day"
Ah,
yeah, oh, yes, I slowly walked away
I
said, "Farewell, farewell, I'll see you on the Judgment Day"
You
know I didn't feel so bad, 'til the good ol' sun went down
I
didn't have a soul to throw my arms around
I
didn't feel so bad, 'til the good ol' sun went down
You
know, I didn't have nobody to throw my arms around
You
know, it's hard to love someone that don't love you
Ain't
no satisfaction, don't care what in the world you do
Yeah,
it's hard to love someone that don't love you
You
know it don't look like satisfaction, don't care what in the world you do
Got
up this mornin', just about the break of day
A-huggin'
the pillow where she used to lay
Got
up this mornin', just about the break of day
A-huggin'
the pillow where my good gal used to lay
Got
up this mornin', feelin' round for my shoes
You
know, I must-a had them old walkin' blues
Got
up this mornin', feelin' round for my shoes
Yeah,
you know bout that, I must-a had them old walkin' blues
Ah,
hush, thought I heard her call my name
If
it wasn't so loud and so nice and plain
Ah,
yeah
Mmmmmm
mmmmm mmmmmm
20 setembro 2015
Tisana 29
Quando cheguei a casa o meu porco Rosalina estava a escrever
à máquina. Fiquei num grande estado de perplexidade e por isso perguntei o que
estás aí a fazer. Sem erguer a cabeça Rosalina apontou com o chispe para o
papel convidando-me a ler. A folha estava em branco porque Rosalina tinha
retirado a fita da máquina para a enrolar na sua encaracolada cauda que nesse
momento agitava com prazer. Rosalina foi sempre o que me impeliu ao mergulho na
metafísica. Por isso sem dizer nada dirigi-me para a cozinha. Abri a gaveta dos
talheres. Tirei a grande faca do estojo do trinchante. Acendi o lume e pus a
grelha a aquecer. Dirigi-me de novo para o escritório onde Rosalina escrevia à
máquina. Cortei-lhe algumas febras do lombo. O suficiente para uma bela refeição.
Cortei também um pedaço de fita para enfeitar a travessa.
Ana Hatherly
19 setembro 2015
la haine
félix valloton
a remexer em discos desarrumados, fui reencontrar este
lamento amargo dos blur.
como um amor antigo mal resolvido, nem a idade o conseguiu adoçar.
18 setembro 2015
[praça camões]
16 setembro 2015
Ya no es
mágico el mundo. Te han dejado.
Ya no
compartirás la clara luna
ni los
lentos jardines. Ya no hay una
luna que no
sea espejo del pasado,
cristal de
soledad, sol de agonías.
Adiós las
mutuas manos y las sienes
que acercaba
el amor. Hoy sólo tienes
la fiel
memoria y los desiertos días.
Nadie pierde
(repites vanamente)
sino lo que
no tiene y no ha tenido
nunca, pero
no basta ser valiente
para
aprender el arte del olvido.
Un símbolo,
una rosa, te desgarra
y te puede
matar una guitarra.
Jorge Luis
Borges
baseado no cântico dos cânticos, um pouco de céu na terra pela mão de david lang
(…)
just your cheeks just your neck just your
couch and my perfume and my beloved and my breasts and my
beloved and my love just your eyes and my beloved our couch
our house our laughters and my love and my beloved just your shadow just
your fruit
(...)
15 setembro 2015
dream of the hungry ghost
colette calascione
14 setembro 2015
[ leituras ]
“uma história da curiosidade”
alberto manguel
ed. tinta da china
conheci manguel pelo seu
dicionário de lugares imaginários, depois pela sua história da leitura e, mais tarde, através do seu relato dos
tempos em que leu para um borges já cego - e tive agora a confirmação da
profunda influência que o ouvinte exerceu sobre o leitor. numa edição cuidada e
graficamente apelativa, este é um livro pouco comum nos tempos que correm. um
crítico citado refere ser um livro infinito, no sentido borgesiano, e tem toda
a razão. ficamos imediatamente presos a este texto: um encantamento similar ao
da primeira leitura de um dos antigos clássicos, como foi mágico esse momento - e como ainda o recordamos, tão nítido...
manguel apoia-se em dante e, numa espécie de
redescoberta da divina comédia, vai tecendo uma rede em torno da nossa ideia de
curiosidade, fundindo literatura, arte e filosofia. aprisionados nessa teia
ficamos a conhecer um pouco mais de shakespeare, diderot, são tomás de aquino,
oscar wilde, ulisses, sherlock holmes, tennyson e tantos outros, num desfile interminável de
personagens de um país das maravilhas, em que a maior é a curiosidade pela
curiosidade. embora acabe por ser de algum modo um relato autobiográfico, é também muito mais do
que isso: são muitos livros num só. e, à semelhança dos ensaios de montaigne -
o leitor actual mantém a sensação de que foram escritos ontem para serem lidos hoje
por si e para si - há parágrafos verdadeiramente geniais, como o que transcrevo
em seguida.
“A arte de ler é, em
muitas maneiras, contrária à arte de escrever. Ler é um ofício que enriquece o
texto concebido pelo autor, aprofundando-o e tornando-o mais complexo,
concentrando-o para que reflicta a experiência pessoal do leitor e expandindo-o
para que alcance os mais longínquos confins do universo do leitor e mais além.
Escrever, ao invés, é a arte da resignação. O escritor tem de aceitar o facto de
que o texto final não será mais do que um reflexo turvo da obra que concebera
na mente, menos iluminado, menos subtil, menos pungente, menos preciso. A
imaginação de um escritor é todo-poderosa e capaz de sonhar as criações mais
extraordinárias em toda a sua desejada perfeição. Depois, vem a descida à
linguagem e, na passagem do pensamento à expressão, muito – muitíssimo – se
perde. Quase não há excepções a esta regra. Escrever um livro é resignarmo-nos
a falhar, por muito honroso que seja esse falhanço.”
Alberto Manguel
13 setembro 2015
Dinheiro e
Literatura
A viúva do
escritor
pedia esmola
à minha avó
a título de
viúva
do escritor
*
Não percebo
nada
de
literatura
a personagem
principal
é a tia
Emiliana
porque é
quem tem o
dinheiro
*
O livro
inédito
do tio
escritor
havia de
fazer
a fortuna
das
herdeiras
mas o editor
pagou pouco
ou a prima
Berta mentiu
Adília Lopes
[ fabula urbis ]
12 setembro 2015
esta é a canção-assinatura dos starliters, e o meu twist favorito. e fico surpreendido por constatar que só agora me lembrei dele. este clip, que mostra o grupo em palco, é todo um documentário sobre o começo dos anos sessenta. e aquela coreografia, uma delícia inigualável.
Well they've got a new dance and it goes like this
(Bop shoo-op, a bop bop shoo-op)
Yeah the name of the dance is the Peppermint Twist
(Bop shoo-op, a bop bop shoo-op)
Well you like it like this, the Peppermint Twist
It goes round and round, up and down
Round and round, up and down
Round and round and up and down
And a one two three kick, one two three jump
Well meet me baby down at 45th street
Where the Peppermint Twisters meet
And you'll learn to do this, the Peppermint Twist
It's alright, all night, it's alright
It's okay, all day, it's okay
You'll learn to do this, the Peppermint Twist Yeah, yeah
11 setembro 2015
[ travessa do marquês de sampaio ]
10 setembro 2015
Tisana 28
Era uma vez
duas serpentes que não gostavam uma da outra. Um dia encontraram-se num caminho
muito estreito e como não gostavam uma da outra devoraram-se mutuamente. Quando
cada uma devorou a outra não ficou nada. Esta história tradicional demonstra
que se deve amar o próximo ou então ter muito cuidado com o que se come.
Ana Hatherly
avenue d and east 10th street
berenice abbott
09 setembro 2015
e, quebrando a promessa de não voltar a fazer referências à superlativa banda sonora de "la grande bellezza", numa súbita ânsia de um pouco de céu na terra, recordo este tema vocal de david lang sobre um texto yiddish.
Leyg ikh mir in bet arayn Un lesh mir oys dos fayer Kumen
vet er haynt tsu mir Der vos iz mire tayer Banen loyfn tsvey a tog Eyne kumt in
ovnt KhÕher dos klingen Ð glin glin glon Yo, er iz shoyn noent Shtundn hot di
nakht gor fil Eyns der tsveyter triber Eyne iz a fraye nor Ven es kumt mayn
liber Ikh her men geyt, men klapt in tir, Men ruft mikh on baym nomen Ikh loyf
arop a borvese Yo! er iz gekumen!