20 setembro 2015






Tisana 29




Quando cheguei a casa o meu porco Rosalina estava a escrever à máquina. Fiquei num grande estado de perplexidade e por isso perguntei o que estás aí a fazer. Sem erguer a cabeça Rosalina apontou com o chispe para o papel convidando-me a ler. A folha estava em branco porque Rosalina tinha retirado a fita da máquina para a enrolar na sua encaracolada cauda que nesse momento agitava com prazer. Rosalina foi sempre o que me impeliu ao mergulho na metafísica. Por isso sem dizer nada dirigi-me para a cozinha. Abri a gaveta dos talheres. Tirei a grande faca do estojo do trinchante. Acendi o lume e pus a grelha a aquecer. Dirigi-me de novo para o escritório onde Rosalina escrevia à máquina. Cortei-lhe algumas febras do lombo. O suficiente para uma bela refeição. Cortei também um pedaço de fita para enfeitar a travessa.





Ana Hatherly




7 comentários:

  1. ... Espero que aquela parte de cortar as febras e da bela refeição seja metáfora. Acho que há ali qualquer coisa escondida só para assustar. Não sei...
    Boa semana!

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    1. ora, mas rosalina
      é nome de cantina

      (boa semana)

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  2. E que cantina tão curiosa! JL, que livros recomenda dela?
    Bj e boa semana

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    1. há uma colectânea antiga da moraes, que abarca os anos 60 e 70, talvez se encontre em alfarrabistas. depois, o magnífico "a cidade das palavras", da quetzal, que reúne as primeiras duzentas tisanas, entre outros poemas. mais recentemente, as deliciosas infusões foram reunidas em "463 tisanas" da quimera. este ainda se deve encontrar por aí. claro que com o seu desaparecimento, não deverá tardar uma "obra completa". bj e boa semana.

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    2. Obrigada pela dica!!!
      bjs

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  3. pois. esta senhora arrepia-me.

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