28 setembro 2021

 




leituras  de  setembro






 


 


 


 


 






:: notas ::


second place

rachel cusk

ed. faber & faber

 

mais uma novela para o pódio do ano. este texto brilhante deve muito (di-lo a autora) a "lorenzo in taos", o relato/memória da estadia de d. h. lawrence na casa/residência artística de mabel dodge luhan no novo méxico. porém, aqui o interesse da mulher narradora é, no lugar do escritor, um pintor. este acede ao convite para visitar a remota e pantanosa região costeira onde ela vive, na crença de que uma visão daquela paisagem conseguirá fazer o artista penetrar no mistério da sua vida. e o relato acaba por ser um estudo das relações interpessoais, da magia da atracção, do que é mostrado exteriormente e escondido no interior e, no fundo, de como a arte tanto pode ser criadora como destrutiva.




stories of art and artists

vv. aa.

ed. everyman's library

 

curiosa colectânea de contos, dedicada a exemplificar o fascínio que a arte e a actividade criadora sempre exerceram sobre os escritores. alguns dos contos são clássicos, outros acabaram por ser uma boa surpresa. nomes incluídos: kafka, camus, barnes, hesse, balzac, yourcenar, berger, lessing, hawthorne, pamuk, byatt, malamud, bender, martin, boyd.

 


  

o atlas

william vollmann

ed. sete nós / snob

 

diz-se que vollmann detesta a edição e revisão dos seus textos. a escrita sai de si assim, jorrando como uma nascente, e as palavras ficam gravadas em pedra. isto, para o melhor e o pior, faz dele um escritor raro. claro que algumas destas histórias (contos? episódios biográficos? nem uma coisa nem outra?), são mais de cinquenta, talvez não merecessem estar ao lado de pérolas como "casas", "uma visão", "encarnações do assassino" e "por baixo da relva" (magnífico texto sobre a morte da irmã), mas um atlas é isso mesmo: há sítios melhores do que outros para viver ou visitar.

 






25 setembro 2021

 


 

 

 

Um  dia,  em  tempos

 

 

 

 

Um dia,
em tempos,

senti-me o homem

mais feliz

do mundo,

 

mas não durou

muito,

alguém

descobriu.

 

 

 

 


Karmelo C. Iribarren

 






19 setembro 2021

 




lou reed e o retrato mais cru de uma certa manhattan hispânica:
continua a ser uma canção fabulosa com letra mais-que-perfeita












13 setembro 2021

 


 


íamos  pelos  nossos  dedos




pois eu sou do tempo em que, uma vez por ano,

tocavam à campainha dois homens que vinham

trocar as listas telefónicas, que ainda eram dois

volumes pesados, um com páginas brancas e o

outro das saudosas amarelas, onde íamos pelos

nossos dedos, intrépidos exploradores absortos

em inesquecíveis viagens comerciais. depois, já

com a nova lista nas mãos, procurava a letra v

e voltava a confirmar a ausência de assinantes

lisboetas com o apelido vinho. havia imensos

vinhas, dois ou três vinha e um único vinhal,

porém nenhum vinho. por que razão perdia

tempo precioso em tão fútil inquérito, ouço

perguntar. pois bem, apenas porque da lista

constavam alguns senhores de apelido verde

e muitos mais de sobrenome branco e eu, na

minha juvenil condição de ignorante da rara

preciosidade do tempo, esbanjava-o a pensar

nos apelidos das crianças que poderiam um

dia nascer da união de uma senhora vinho

com um senhor verde ou branco. parvoíces.







07 setembro 2021

 



 

Fado  maior

 

 

 

 

Choram os fados. Leais, trabalhadores.

Se os fados doem, o suor acende-os.
Em cada verso meu, a ti, fado,

quem te construiu?

Sou eu a substância viva do meu choro

ou esta Pátria vil que cala a chumbo

a areia das marés

dum poeta náufrago no chão seco dos mitos?

Aqui o mar se inverte. A terra sabe a peixes

nas leivas feitas ondas e a história é na planície

uma frota parada de moinhos sem vento.

 

 

 



Armando Silva Carvalho

 






01 setembro 2021

 

 

 

agá  agá

  

 

 

e confesso que já pensei nisto a sério: 

passar a assinar homero honorato ou  

hermínia hungria ou hugo herrera ou

herculano herédia ou heitor horta ou

hélio hamburgo ou heloísa hilário ou

helena holanda ou henrique hogan ou

hortênsia hermano ou humberto harpa

ou qualquer possível parelha de nome e

sobrenome ambos iniciados pela letra h

para poder utilizar o acrónimo agá agá,

o qual, quando pensamos em herberto

helder ou hilda hilst, parece ser garantia

de talento certo e caudalosa veia poética