27 outubro 2018





adivinhas


  

diz-me lá, qual é a coisa qual é ela que
quando se parte jamais se conserta mas
uma vez consertada nunca pode partir,
quem é que escreve essas tuas palavras
que passaram além da dor sem dobrar o
bojador, quantos poetas há dentro de ti,
que voz vem no som das ondas que não 
é a voz do mar, que canção entoaram as
sereias quando apenas ulisses as ouviu e
quais são os poemas que oculto em mim


porque o que eu queria mesmo era saber
qual é a cor do cavalo branco de napoleão
após o teres mergulhado em tinta invisível





23 outubro 2018





ontem preferi mostrar um livro
mas se aqui estivesses ontem
festejarias cinquenta anos








we were but stones... your light made us stars




22 outubro 2018





o começo de um livro é precioso,
dizia a llansol,
mas o final não lhe fica atrás




[6] :: ...e nasceu





19 outubro 2018





o começo de um livro é precioso,
dizia a llansol,
mas o final não lhe fica atrás





[5] :: a fábula náufraga esculpida em 36 pedras de calcário comum





17 outubro 2018





o começo de um livro é precioso,
dizia a llansol,
mas o final não lhe fica atrás.




[4] :: prova de miolo





15 outubro 2018






Podia talvez esquecer algo que escrevi
e voltar a escrevê-lo da mesma maneira.

Podia escrever a vida que vivi
e voltar a vivê-la da mesma maneira.

Podia esquecer a morte que amanhã morrerei
e voltar a morrê-la da mesma maneira.

Mas há sempre um grão de poeira
a deter a engrenagem das repetições:

Podia esquecer algo que amei
mas não voltar a amá-lo da mesma maneira.



Roberto Juarroz





12 outubro 2018





o começo de um livro é precioso,
dizia a llansol,
mas o final não lhe fica atrás.





[3] :: prova de capa





09 outubro 2018






Passei a tarde no supermercado,
os pêssegos em promoção,
as ameixas gordas,
três tristes figos abandonados,
lamentavelmente murchos os espargos,
o corredor dos congelados a pedir casaco,
não encontrei um único iogurte fora de prazo,
não encontrei nas caixas nenhum ovo partido,
não encontrei arroz basmati,
não encontrei chá de alcachofra,
não encontrei um único sorriso,
nem no rapaz da charcutaria
que enquanto avia clientes
fatia fiambre, fatias fininhas,
as pessoas gostam das fatias fininhas,
canta as canções da telefonia,
pergunto-me de onde lhe virá a alegria,
vim sem compras,
feliz por poder fugir à fila da caixa,
não precisava de víveres,
precisava sentir que vivia, há vidas assim.


  

Raquel Serejo Martins





08 outubro 2018





confesso que toda esta polémica sobre algum mobiliário indecoroso,
em que aparentemente se censuraram fotografias de maples torpes,
me trouxe à memória a decoração do famoso korova milk-bar...
sharpen you up and make you ready for a bit of the old ultra-violence










03 outubro 2018





Tenho tido deus de sobra.

Devo recortar os seus contornos
e recuperar a fala,
antes que se apaguem os meus limites.

Devo reconhecer uma vez mais o campo
e dizer-me três ou quatro palavras,
antes que tudo se unifique.

Devo transplantar o que amo
e assegurar-lhe pelo menos uma fonte,
antes que me vire de costas.

Devo salvar algumas coisas
ainda que não me salve,
antes que tudo se perca.

E para isso é preciso
que deus me vá faltando.




Roberto Juarroz