15 agosto 2014





quase trinta anos depois, já posso confessar à vontade: 
aprendi a não confiar em quem não gosta dos smiths…



call me morbid, call me pale
i've spent six years on your trail
six long years on your trail

call me morbid, call me pale
i've spent six years on your trail
six full years of my life on your trail

and if you have five seconds to spare
then i'll tell you the story of my life :
sixteen, clumsy and shy
i went to london and i
i booked myself in at the y... w.c.a.
i said: "i like it here - can i stay?
i like it here - can i stay?
do you have a vacancy
for a back-scrubber?"

she was left behind, and sour
and she wrote to me, equally dour
she said : "in the days when you were
hopelessly poor
i just liked you more..."

and if you have five seconds to spare
then i'll tell you the story of my life :
sixteen, clumsy and shy
i went to london and i
i booked myself in at the y... w.c.a.
i said: "i like it here - can i stay?
i like it here - can i stay?
and do you have a vacancy
for a back-scrubber?"

call me morbid, call me pale
i've spent too long on your trail
far too long chasing your tail

and if you have five seconds to spare
then i'll tell you the story of my life :
sixteen, clumsy and shy
that's the story of my life
sixteen, clumsy and shy
the story of my life
that's the story of my life




14 agosto 2014








betty joan perske  a.k.a.  lauren bacall
bert six








"You don't have to say anything and you don't have to do anything. Not a thing. Oh… maybe just whistle… You know how to whistle, don't you, Steve? You just put your lips together and... blow…"







05 agosto 2014






fábula  contendo  sinais  de  amor






(exclamar um amor admirado!
tentar amar sem reticências…
como ignorar as interrogações?)

o que faria se lhe pertencessem
o til do seu cabelo de romã
a cedilha da sua pele de açafrão
o apóstrofo dos seus olhos d’água?

desconhecia que o amor
é agudo por ser único,
circunflexo por ser sôfrego
e se esconde (entre parênteses);

mas como amá-la lhe era vedado,
(((((( imaginou-se a beijá-la ))))))
num amor proibido. ponto final.







04 agosto 2014







avenue de l'opera
camille pissarro









um azul standard para marcar o início de férias. escrito por james b. oden, também conhecido por st. louis jimmy, é dos que tem mais covers gravadas. as mais famosas têm a assinatura de howlin' wolf, b.b. king, jimmy witherspoon e little walter, mas a minha preferida é a de william thomas dupree, que veio a ser um dos mais famosos pianistas de sempre, merecendo o nome de champion jack dupree.




I have had my fun

If I don't get well no more

My health is failing me

And I'm going down slow

Please write my mother

Tell her the shape I'm in

Tell her to pray for me

Forgive me of all my sins

Tell her don't send no doctor

Doctor can't do me no good

It is all my fault

I didn't do the things I should

On the next train south
Look for my clothes, home
If you don't see my body
All you can do is moan

Mother, please don't worry

This is all in my prayer
Just say you got a son
Out of this world somewhere






03 agosto 2014







É a prata da minha amada





É a prata da minha amada.
Dir-lhe-ei docemente adeus,
e que não arranque os espinhos da primeira rosa,
subindo pela vida.
E quando eu caminhar pelo vale da sombra,
ela descerá ao pequeno porto, descalçando as sandálias,
mergulhando no mar,
repetindo os nomes de todos os que partiram,
de todos os que a amaram,
hesitando à entrada da taberna,
vendo o meu lugar vazio, o violino sobre a mesa, um
silêncio maior que a lentidão das praias,
e pensará em tudo, em cada som, em cada lágrima, em
nada.
Ela voltará as costas.
Nunca fomos deste mundo, dir-lhe-ei por fim, ao fechar
a última porta.







José Agostinho Baptista














samuel l. jackson
platon antoniou




02 agosto 2014






As carroças da rua sonsonam, sons separados, lentos, de acordo, parece, com a minha sonolência. É a hora do almoço mas fiquei no escritório. O dia é tépido e um pouco velado. Nos ruídos há, por qualquer razão, que talvez seja a minha sonolência, a mesma coisa que há no dia.
()
Penso às vezes que nunca sairei da Rua dos Douradores. E isto escrito então parece-me a eternidade.







Bernardo Soares













[a fugaz livraria do desassossego ]




31 julho 2014







Quanto mais urgente é a escrita
mais humilde o suporte.

Tudo o que realmente importa
foi escrito
em bilhetes de autocarro,
guardanapos quase translúcidos,
versos de sobrescritos,
pacotes de pastilha elástica.

E ninguém o compreende
porque quanto mais urgente
a escrita
mais ilegível a letra.









Ana Tecedeiro















sem espaço para ti
ana tecedeiro





29 julho 2014





fábula  do  fundo  dos  teus  olhos





sabes, houve um tempo em que os teus olhos eram todo o meu mar
olhava para o fundo dos teus olhos e nunca via o que não podia ser
o que busco nestas águas e sei não estar escrito em cartas de marear
o brilho do sol sobre o salpico de espuma no vento que enfuna a vela
olhava para o fundo dos teus olhos e apenas via o que não podia ter
um mastro erguido contra a solidão na breve leveza da âncora içada


mas ontem olhei para os teus olhos e não vi senão o fundo dos meus













[ mouraria ]





28 julho 2014






diz-se que, no final da sua carreira, frequentemente a sua mulher tinha de o ajudar a relembrar as letras dos seus azuis, mesmo dos mais famosos. e por vezes penso nisso, no que poderia ter sido o percurso de mathis james reed se o alcoolismo e a epilepsia não tivessem acelerado o seu desaparecimento precoce. 



Baby plea, first time I plea to you

Baby plea, first time I plea to you

Darlin', now ya got me so upset, baby,
Because I don't know what-a-do

Don't pull no subway, I rather see you pull a train

Don't pull no subway, I rather see you pull a train

You know I love you, love ya baby, girl,
You know it's a cryin' shame

Feel so bad, baby, feel like my heart's skippin' a beat

Feel so bad, baby, feel like my heart skip a beat

Well now, I'm tellin' you pretty baby,
Don't you know what you're doin' to me?











dust heads
jean-michel basquiat





27 julho 2014







[ e alfama e o tejo e tudo ]










Sobre as colinas de Lisboa





Como se fossem várias vidas e outros eus
e a alma se mudasse e a própria pele
sobre as colinas de Lisboa eu digo adeus
e há um Deus que não cabe no papel
cujo sentido não sei e que me soa
como ausência e distância ou o desejo
de saber quem eu sou vendo em Lisboa
outros eus nas colinas sobre o Tejo.

Sobre as colinas de Lisboa eu busco o fio
e quanto mais me busco me disperso
sobre as colinas de Lisboa olhando o rio
e o tempo que passou esperando um verso
a História de rompante e a vida à toa.
Consoante amor se tem (e amor eu tive-o)
consoante amor se tem vem o reverso.
Eis o que escrevo sobre as colinas de Lisboa.

Sobre as colinas de Lisboa a noite cai
e eu olho o Tejo ponto de partida.
Há um barco a chegar outro que sai
assim fui eu. Também assim a vida
e tudo o que se tem é tempo que se escoa
eu próprio sou quem fica e sou quem vai
melancolia ausência despedida
olhando o Tejo das colinas de Lisboa.

Quase todos casaram têm filhos outros não
aos poucos vão morrendo em sua insónia.
Foi ontem foi há um século nunca foi
sobre os rios que vão cantámos por Sião
também nós também nós em Babilónia.
Há guerras que não acabam: a nossa dói.
Sobre as colinas de Lisboa ainda vejo
os barcos que já não vão e são o Tejo.

É a mesma paisagem e outra paisagem
não são os olhos é o tempo que não perdoa.
Consoante o amor se tem assim a imagem
consoante a vida – essa miragem – embora doa
não fazer ao contrário a grande viagem.
Olhando para trás já me não vejo
sou a minha própria ausência nas colinas de Lisboa
ninguém passa duas vezes no mesmo Tejo.

Não é questão de desejo ou não desejo
ninguém é eterno duas vezes num momento
fragmento a fragmento a memória entoa
a passagem do grande rio do esquecimento
não fica senão um gesto um rastro um breve beijo
a memória é uma montagem o resto vai no vento
e ninguém volta nunca ao mesmo Tejo.
Não sei quem sou sobre as colinas de Lisboa.







Manuel Alegre