29 fevereiro 2012






O horizonte das palavras




Sem direcção, sem caminho
escrevo esta página que não tem alma dentro.
Se conseguir chegar à substância de um muro
acenderei a lâmpada de pedra na montanha.
E sem apoio penetro nos interstícios fugidios
ou enuncio as simples reiterações da terra,
as palavras que se tornam calhaus na boca ou nos meus passos.
Tentarei construir a consistência num adágio
de sílabas silvestres, de ribeiros vibrantes.
E na substância entra a mão, o balbucio branco
de uma língua espessa, a madeira, as abelhas,
um organismo verde aberto sobre o mar,
as teclas do verão, as indústrias da água.
Eu sou agora o que a linguagem mostra
nas suas verdes estratégias, nas suas pontes
de música visual: o equilíbrio preenche os buracos
com arcos, colinas e com árvores.
Um alvor nasceu nas palavras e nos montes.
O impronunciável é o horizonte do que é dito.





António Ramos Rosa












jardim da estrela










claro que, ao falar em pecado, também me ocorreu este par de assassinos...



Get down, get down, little Henry Lee
And stay all night with me
You won't find a girl in this damn world
That will compare with me
And the wind did howl and the wind did blow
La la la la la
La la la la lee
A little bird lit down on Henry Lee
I can't get down and I won't get down
And stay all night with thee
For the girl I have in that merry green land
I love far better than thee
And the wind did howl and the wind did blow
La la la la la
La la la la lee
A little bird lit down on Henry Lee
She leaned herself against a fence
Just for a kiss or two
And with a little pen-knife held in her hand
She plugged him through and through
And the wind did roar and the wind did moan
La la la la la
La la la la lee
A little bird lit down on Henry Lee
Come take him by his lilly-white hands
Come take him by his feet
And throw him in this deep deep well
Which is more than one hundred feet
And the wind did howl and the wind did blow
La la la la la
La la la la lee
A little bird lit down on Henry Lee
Lie there, lie there, little Henry Lee
Till the flesh drops from your bones
For the girl you have in that merry green land
Can wait forever for you to come home
And the wind did howl and the wind did moan
La la la la la
La la la la lee
A little bird lit down on Henry Lee






28 fevereiro 2012






quando me perguntam se é possível musicar a ideia de pecado, aponto sempre esta canção.
original dos franceses air, recriado magistralmente pelos alemães [re:jazz], conta com a voz da grande lisa bassenge e,
quando se ouve esta delícia, acho mesmo impossível não cometer vários pecados mortais (pelo menos em pensamento) .
sabemos que há um preço a pagar – a impossibilidade de redenção – mas é um pecado tão superlativamente cooool…



all i need is a little time,
to get behind this sun and cast my weight,
all i need is a peace of this mind,
then i can celebrate.

all in all there's something to give,
all in all there's something to do,
all in all there's something to live,
with you...

all i need is a little sign,
to get behind this sun and cast this weight of mine,
all i need is the place to find,
and there i'll celebrate.

all in all there's something to give,
all in all there's something to do,
all in all there's something to live,
with you.













castelo de são jorge








Paráfrase




Este poema começa por te comparar
com as constelações,
com os nomes mágicos
e desenhos precisos,
e depois
um jogo de palavras indica
que sem ti a astronomia
é uma ciência infeliz.
Em seguida, duas metáforas
introduzem o tema da luz
e dos contrastes
petrarquistas que existem
na mulher amada,
no refúgio triste da imaginação.


A segunda estrofe sugere
que a diversidade de seres vivos
prova a existência
de Deus
e a tua, ao mesmo tempo
que toma um por um
os atributos
que participam da tua natureza
e do espaço criador
do teu silêncio.


Uma hipérbole, finalmente,
diz que me fazes muita falta.





Pedro Mexia





27 fevereiro 2012





costumo dizer que comecei cedo a gostar de azuis, mas cheguei tarde a john lee hooker.
e só me apercebi da sua evidente paternidade quando desapareceu - e a sua marca continuou em outros.
adorava ter tido a possibilidade de o ver tocar, dizem que era algo verdadeiramente único, mas até nisso não tive sorte.



They call me, Mr. Lucky
Bad luck don't follow me
They call me, Mr. Lucky
Bad luck don't follow me
Everything I touch is turn to gold
That mean I can't do no wrong
I woke early one mornin'
Mr. Lucky, standin' by my bed
I woke early one mornin'
Mr. Lucky, standin' by my bed
I listened to him real closely
This is what he said
'You was born for good luck, Johnny'
'Bad luck can't do you no harm'
'You was born for good luck'
'Bad luck can't do you no harm'
'I guarantee you'll never go wrong'
That's why they call me, Mr. Lucky
Bad luck don't follow me
That's why they call me, Mr. Lucky
Bad luck don't follow me
Everything I touch is turn to gold
I never felt misery












janelas de lisboa










o álbum “tourist” contém pelo menos duas das canções da minha vida, e esta é uma delas.
escrita por ludovic navarre (os st. germain são ele), nela se repetem dois versos apenas (dois samples de “woman of the ghetto” de marlena shaw) e se encerram dois fabulosos solos, de trompete e sax barítono: é o que se chama um "instant classic"...



I want you to get together
Put your hands together one time










Por favor não me deixes




Por favor não me deixes o
tubo da pasta dos dentes premido
do lado da ponta.





João Luís Barreto Guimarães






26 fevereiro 2012









in memoriam
[Erland Josephson, 1923-2012]











quando, já organista da sé e da capela real, o senhor seixas escreveu esta obra, julga-se que por volta de 1742, ainda as companhias de aviação não proporcionavam voos low-cost entre leipzig e lisboa...
creio ser mesmo essa a única razão que terá impedido o senhor bach de visitar o jovem carlos e matar a sua natural curiosidade perante a pequena maravilha que é este delicioso concerto em lá - se é que alguma vez o ouviu.



[mas confessa, joão sebastião, não te importavas de ter escrito isto...]










Metamorfoses da casa




Ergue-se aérea pedra a pedra
a casa que só tenho no poema.

A casa dorme, sonha no vento
a delícia súbita de ser mastro.

Como estremece um torso delicado,
assim a casa, assim um barco.

Uma gaivota passa e outra e outra,
a casa não resiste: também voa.

Ah, um dia a casa será bosque,
à sua sombra encontrarei a fonte
onde um rumor de água é só silêncio.




Eugénio de Andrade












travessa do sequeiro





25 fevereiro 2012






fábulas de lisboa




viii. a fertilidade da resistência



( lê-se melhor aqui )









Evelina, uma cadela transgénica




Evelina, uma cadela transgénica,
Observou a franja ondulante de um naperon especial
Estendido sobre o piano, com alguma surpresa

No quarto escurecido,
Onde as cadeiras desalentavam
E as cortinas horríveis
Abafavam a chuva,
Ela mal podia acreditar nos seus olhos

Uma estranha brisa
Um bafo a alho
Que soava como um ronco
Algures perto do Steinway (ou até mesmo de dentro dele)
Tinha feito a franja do naperon flutuar e tremer na escuridão

Evelina, uma cadela, tendo sofrido
Uma modificação ulterior,
Ponderou no significado do comportamento de pessoas baixas
Em ressonância pancromática sob um pedal premido
E em outros domínios ambientais superiores...

“Arf”, disse ela.




(tradução absolutamente livre do autor, com muitas saudades do mestre)







Possibilidades




Prefiro cinema.
Prefiro os gatos.
Prefiro os carvalhos nas margens do Warta.
Prefiro Dickens a Doistoievski.
Prefiro-me gostando dos homens
em vez de estar amando a humanidade.
Prefiro ter uma agulha preparada com a linha.
Prefiro a cor verde.
Prefiro não afirmar
que a razão é culpada de tudo.
Prefiro as excepções.
Prefiro sair mais cedo.
Prefiro conversar com os médicos sobre outra coisa.
Prefiro as velhas ilustrações listradas.
Prefiro o ridículo de escrever poemas
ao ridículo de não escrever.
No amor prefiro os aniversários não redondos
para serem comemorados cada dia.
Prefiro os moralistas,
que não prometem nada.
Prefiro a bondade esperta à bondade ingénua demais.
Prefiro a terra à paisana.
Prefiro os países conquistados aos países conquistadores.
Prefiro ter abjecções.
Prefiro o inferno do caos ao inferno da ordem.
Prefiro contos de fada de Grimm às manchetes de jornais.
Prefiro as folhas sem flores às flores sem folhas.
Prefiro os cães com o rabo não cortado.
Prefiro os olhos claros porque os tenho escuros.
Prefiro as gavetas.
Prefiro muitas coisas que aqui não disse,
e outras tantas não mencionadas aqui.
Prefiro os zeros à solta
a tê-los numa fila junto ao algarismo.
Prefiro o tempo do insecto ao tempo das estrelas.
Prefiro isolar.
Prefiro não perguntar quanto tempo ainda e quando.
Prefiro levar em consideração até a possibilidade
do ser ter a sua razão.





Wislawa Szymborska














alcainça





24 fevereiro 2012






ando com saudades do flower power, e sinto-me cada vez mais neo-hippie... a sério.
dizem que pode haver por aí uma revolução silenciosa qualquer, e eu queria que houvesse.
que o silêncio dos introvertidos fosse uma canção de amor e, já agora, que a banda sonora fosse esta:



Love is gentle as a rose
And love can conquer any war
It's time to take a stand
Brothers and sisters join hands

We got to let love rule
Let love rule

Love transcends all space and time
And love can make a little child smile
Can't you see this won't go wrong
But we got to be strong
We can't do it alone

We got to let love rule
Let love rule













praça de são paulo









Tisana 18.




Era uma vez uma cidade habitada por palavras em que cada uma vivia em sua casa com as portas fechadas mas constantemente se visitavam ou então saíam para a rua e passeando cruzavam-se com as outras palavras e saudavam-se mas com o crescimento progressivo da cidade as palavras quando saíam para a rua começavam a chocar umas com as outras e chocando-se retiravam-se encolerizadas e regressavam a casa mas já não regressavam como haviam saído e dentro de casa aumentavam por um efeito de cólera morosa e lembrando sempre as outras palavras começavam crescendo dentro de suas casas e da próxima vez que saiam para a rua já iam transformadas e quando encontravam outra vez as outras palavras passava-se outra vez a mesma coisa e regressavam a casa e continuavam a crescer e sempre em direcções diferentes e cresciam de tal modo que já não conseguiam fechar as portas e novos braços abriam as janelas e a cólera subia pelas paredes e começavam a escavar o tecto e ligadas ao andar de cima entrelaçavam-se à palavra do outro apartamento que também estava encolerizada e já chegava até ao telhado e subia pela antena de televisão e gritava encolerizada com as palavras dos outros prédios já subindo pelo céu acima e toda a cidade estava aos gritos e já não havia mais espaço para as palavras crescerem a não ser emaranhadas umas nas outras e os seus gritos confundiam-se e as palavras estavam todas unidas irremediavelmente e gritavam todas ao mesmo tempo de modo que ao longe era só um grito enorme que mais longe se transformava num sussurro e de muito mais longe até não se ouvia nada.





Ana Hatherly






23 fevereiro 2012








rua da emenda








quando me perguntam qual é a minha canção pop portuguesa preferida, respondo sempre: ainda é "zap canal"...
tem uma letra que define bem o que foram aqueles anos (pelo menos para mim) e é uma obra-prima de composição e arranjo.
(e sempre achei que se ana deus, regina guimarães e alexandre soares fossem ingleses, os three sad tigers teriam tido outro destino)



Play on zap canal
Chuva na sala, cravo no quintal
Play back mau astral
A vaca d’oiro tem seu animal

Olho vivo, perna morta
Não dou mais salsa a quem bate à porta
Olho pisco perna torta
Dá-me um sono de alto risco e de sonhar estou farta e morta

Anos noventa bem medidos
Corpo em câmara lenta
Corações mais distraídos e...
E matéria mais cinzenta

Leve seja a terra
A quem não lavra, a quem não ferra
Dura seja a cama
De quem não perde, de quem não se dana

Glória a Deus Pai
Na baixeza, os fracos à sobremesa
Paz na terra Mãe...
A cabidela dos fortes digere-se muito bem



















cais da rocha










( ... )
Ah, todo o cais é uma saudade de pedra!
E quando o navio larga do cais
E se repara de repente que se abriu um espaço
Entre o cais e o navio,
Vem-me, não sei porquê, uma angústia recente,
Uma névoa de sentimentos de tristeza
Que brilha ao sol das minhas angústias relvadas
Como a primeira janela onde a madrugada bate,
E me envolve como uma recordação duma outra pessoa
Que fosse misteriosamente minha.
( ... )
Gostaria de ter outra vez ao pé da minha vista só veleiros e barcos de madeira,
De não saber doutra vida marítima que a antiga vida dos mares!
( ... )
Todo o vapor ao longe é um barco de vela perto.
Todo o navio distante visto agora é um navio no passado visto próximo.
Todos os marinheiros invisíveis a bordo dos navios no horizonte
São os marinheiros visíveis do tempo dos velhos navios,
Da época lenta e veleira das navegações perigosas,
Da época de madeira e lona das viagens que duravam meses.
( ... )





Álvaro de Campos













um desejo chamado eléctrico





22 fevereiro 2012





por falar nas virtudes profiláticas do contacto labial,
sabias que há beijos inassepticamente terapêuticos?
e que nos lábios está uma cura? sim tu... sabias?


hey you! yes you,
you the one that looks like christmas
come over here and kiss me, kiss me

hey you! yes you,
you the one that looks delirious
come over here and kiss me, kiss me















janelas de lisboa










a menina leigh nash canta uma das grandes canções pop que sei serem da minha vida.
lembro-me de ter ficado surpreendido quando vi este clip, pois associava a voz a outra cara.
nunca mais soube nada nela, mas volto a esta canção muitas vezes. é... adoro beijos...



kiss me out of the bearded barley
nightly, beside the green, green grass
swing, swing, swing the spinning step
you wear those shoes and i will wear that dress

oh, kiss me beneath the milky twilight
lead me out on the moonlit floor
lift your open hand
strike up the band and make the fireflies dance
silver moon's sparkling
so kiss me

kiss me down by the broken tree house
swing me upon its hanging tire
bring, bring, bring your flowered hat
we'll take the trail marked on your father's map













alfama









A palavra




A palavra é uma estátua submersa, um leopardo
que estremece em escuros bosques, uma anémona
sobre uma cabeleira. Por vezes é uma estrela
que projecta a sua sombra sobre um torso.
Ei-la sem destino no clamor da noite,
cega e nua, mas vibrante de desejo
como uma magnólia molhada. Rápida é a boca
que apenas aflora os raios de uma outra luz.
Toco-lhe os subtis tornozelos, os cabelos ardentes
e vejo uma água límpida numa concha marinha.
É sempre um corpo amante e fugidio
que canta num mar musical o sangue das vogais.





António Ramos Rosa





21 fevereiro 2012








na rua em lisboa








ouvi uma vez gismonti ao vivo, mas nunca este trio de luxo, com haden e garbarek.
um dos lamentos que tenho é esse, o de nunca ter ouvido “palhaço” tocado num palco.
e também fiquei sempre a pensar no que o trio de jarrett poderia ter feito com esta canção (sem palavras) da minha vida…









La carta




Mirabas siempre hacia adelante
como si allí estuviese el mar. Creabas
de esta manera un movimiento de olas
ajeno y mítico en alguna playa.
Nos unía la fuerza peligrosa
que da al amor la soledad.
Aún hace temblar entre mis dedos,
de forma imperceptible este papel.
Camino abandonado entre tú y yo,
cubierto por las cartas, hojas muertas.
Pero sé que el camino persiste.
Si abandono la mano sobre el pequeño fajo,
la siento descansar sobre tu espalda.
Solías escuchar hacia adelante
como si allí estuviese el mar, ya transformado
en una voz cansada, ronca y cálida.
Poco nos une aún: sólo el temblor
de este papel tan fino entre los dedos.





Joan Margarit












avenida da liberdade





20 fevereiro 2012












Há palavras que nos beijam








Há palavras que nos beijam
Como se tivessem boca.
Palavras de amor, de esperança,
De imenso amor, de esperança louca.


Palavras nuas que beijas
Quando a noite perde o rosto;
Palavras que se recusam
Aos muros do teu desgosto.


De repente coloridas
Entre palavras sem cor,
Esperadas inesperadas
Como a poesia ou o amor.


(O nome de quem se ama
Letra a letra revelado
No mármore distraído
No papel abandonado)


Palavras que nos transportam
Aonde a noite é mais forte,
Ao silêncio dos amantes
Abraçados contra a morte.











Alexandre O'Neill




















central tejo









outro dos azuis da minha vida, este é quase uma espécie de standard, escrito por william handy e imortalizado por bessie smith e louis armstrong, e tantos outros que o conseguiram re-inventar.
entre os mais recentes cultivadores, destaco peter cincotti, aqui numa fabulosa versão ao vivo e literalmente no meio da rua – exactamente onde a música deveria estar para ser sempre uma massagem para a alma e uma festa para os sentidos.


I hate to see the evenin' sun go down,
I hate to see the evenin' sun go down,
'Cause my baby she left this town

Feelin' tomorrow, just like I feel today,
Feelin' tomorrow, just like I feel today,
I'll pack my trunk and make my get-away

St. Louis woman, with her diamond rings,
She pulls her man around, by her apron strings;
She wants for powder, and for store-bought hair,
The man she loves he wouldn't go nowhere

St. Louis woman, with her diamond rings,
She pulls her man around, by her apron strings;
She wants for powder, and for store-bought hair,
The man she loves he wouldn't go nowhere




19 fevereiro 2012








um desejo chamado eléctrico









Lenda



Abel e Caim encontraram-se depois da morte de Abel. Caminhavam pelo deserto e reconheceram-se de longe, porque eram ambos muito altos. Os irmãos sentaram-se na terra, fizeram uma fogueira e comeram. Guardavam silêncio, à maneira das pessoas cansadas quando declina o dia. No céu aparecia uma ou outra estrela, que ainda não recebera nome. À luz das chamas, Caim reparou na marca da pedra na testa de Abel e deixou cair o pão que ia levar à boca e pediu que lhe fosse perdoado o seu crime.
Abel respondeu:
- Tu mataste-me ou fui eu que te matei? Já não me lembro; aqui estamos juntos como dantes.
- Agora sei que na verdade me perdoaste – disse Caim – porque esquecer é perdoar. Eu tratarei também de esquecer.
Abel disse devagar:
- É verdade. Enquanto dura o remorso, dura a culpa.




Jorge Luis Borges












jardins gulbenkian









outra das canções da minha vida escrita pelo sr. nicholas edward cave, e favorita de muita gente.
canção de abertura do album “the boatman’s call”, consta ter sido escrita numa igreja inglesa em surrey.
talvez seja esse ambiente de paz celestial que tanto contribui para a celebração da felicidade de um amor encontrado.



I don't believe in an interventionist God
But I know, darling, that you do
But if I did I would kneel down and ask Him
Not to intervene when it came to you
Not to touch a hair on your head
To leave you as you are
And if He felt He had to direct you
Then direct you into my arms

Into my arms, O Lord
Into my arms, O Lord
Into my arms, O Lord
Into my arms

And I don't believe in the existence of angels
But looking at you I wonder if that's true
But if I did I would summon them together
And ask them to watch over you
To each burn a candle for you
To make bright and clear your path
And to walk, like Christ, in grace and love
And guide you into my arms

Into my arms, O Lord
Into my arms, O Lord
Into my arms, O Lord
Into my arms

And I believe in Love
And I know that you do too
And I believe in some kind of path
That we can walk down, me and you
So keep your candlew burning
And make her journey bright and pure
That she will keep returning
Always and evermore

Into my arms, O Lord
Into my arms, O Lord
Into my arms, O Lord
Into my arms






18 fevereiro 2012








janelas de lisboa









fábulas de lisboa



vii. cais do sodré



( lê-se melhor aqui )








Poema




As palavras mais nuas
as mais tristes.
As palavras mais pobres
as que vejo
sangrando na sombra e nos meus olhos.


Que alegria elas sonham, que outro dia,
para que rostos brilham?


Procurei sempre um lugar
onde não respondessem,
onde as bocas falassem num murmúrio
quase feliz,
as palavras nuas que o silêncio veste.


Se reunissem
para uma alegria nova,
que o pequenino corpo
de miséria
respirasse o ar livre,
a multidão dos pássaros escondidos,
a densidade das folhas, o silêncio
e um céu azul e fresco.




António Ramos Rosa





17 fevereiro 2012








rua das flores









Eu amo



Eu amo o teu gravador de chamadas.
Ele não me abandona
e repete vezes sem conta
a tua voz.




Pedro Mexia









a versão mais antiga que conheço é de etta james, que só descobri nos anos oitenta e ouvi muito,
mas confesso que a menina adu tem qualquer coisa de especial na forma como aborda esta canção.


Heaven please send to all mankind,
Understanding and peace and mind.
But if it is not asking too much,
Please send me someone to love.

Show the world how to get along,
And peace will enter, when hate is gone.
But if its not asking too much,
Please send me someone to love.

I lie awake nights, and ponder a world of trouble
And my answer is always the same.
That when this man put an end to all of this
Hate will put the world in a flame - what a shame

Just because I’m ... in misery
I dont beg for no sympathy
But if it is not asking too much,
Just send me someone to love.














cais da rocha






16 fevereiro 2012







em estado de graça (edward & claude)


(desviado deste planeta)









A meias




Bebo o meu café enquanto bebes
do meu café. Intriga-me que faças isso.
Se te posso pedir um
(se podes tomar um igual)
porque hás-de querer do meu?
Que
não. Que não queres. Escuso
de pedir
que não queres. Então
começo um cigarro e tu fumas
do meu cigarro dizes
«tenho quase a certeza de
não acabar um sozinha» por isso
fumas do meu.
Dá-te gozo esse roubar de
leves goles furtivos
dá gozo participar
do prazer que eu possa ter
contigo
(e entre nós)
dá-se agora tudo
a meias.




João Luís Barreto Guimarães












tapada das necessidades





15 fevereiro 2012





outra das minhas canções favoritas de waits (estou apaixonado por ela desde a primeira vez que a ouvi), tem uma melodia belíssima, um piano gravado ao vivo (com ruídos do mecanismo e do ranger da madeira e tudo) e um verso brutal “it's got to be more than flesh and bone/all that you've loved is all you own”.
também sempre achei que era uma canção que podia – e devia – ser cantada por uma voz feminina, e solveig slettahjell dá-me toda a razão.







phone's off the hook no one knows where we are
it's a long time since i drank champagne
the ocean is blue as blue as your eyes
i'm gonna take it with me when i go

old long since gone now way back when
we lived in coney island
ain't no good thing ever dies
i'm gonna take it with me when i go

far far away a train whistle blows
wherever you're goin wherever you've been
waving good bye at the end of the day
you're up and you're over and you're far away

always for you, and forever yours
it felt just like the old days
we fell asleep on beaula's porch
i'm gonna take it with me when i go

all broken down by the side of the road
i was never more alive or alone
i've worn the faces off all the cards
i'm gonna take it with me when i go

children are playing at the end of the day
strangers are singing on our lawn
it's got to be more than flesh and bone
all that you've loved is all you own

in a land there's a town and in that town there's
a house and in that house there's a woman
and in that woman there's a heart i love
i'm gonna take it with me when i go












um desejo chamado eléctrico





(no rescaldo do dia do love & isso...)





Quadrilha



João amava Teresa que amava Raimundo
que amava Maria que amava Joaquim que amava Lili
que não amava ninguém.
João foi para os Estados Unidos, Teresa para o convento,
Raimundo morreu de desastre, Maria ficou para tia,
Joaquim suicidou-se e Lili casou com J. Pinto Fernandes
que não tinha entrado na história.




Carlos Drummond de Andrade





(para a rosa, por causa daquele clip)

14 fevereiro 2012

(diz que é ideal para ouvir hoje)







A man is in love,
How do I know?
He came and walked with me
And he told me so,
In a song he sang
And then I knew,
A man is in love
With you.

A man is in love,
How did I hear?
I heard him talk too much
Whenever you're near,
He whispered your name
When his eyes were closed,
A man is in love
And he knows.

A man is in love,
How did I guess?
I figured it out while he was
Watching you dress,
He'd give you his all
If you'd but agree,
A man is in love...
And he's me.







(diz que é ideal para ler hoje)






Poema de amor




Esta noite sonhei oferecer-te o anel de Saturno
e quase ia morrendo com o receio de que não
te coubesse no dedo





Jorge Sousa Braga













janelas de lisboa





13 fevereiro 2012







se há pessoa no mundo da música que gostava mesmo de ter ouvido tocar ao vivo (para além de bach), era jimi hendrix.
o homem que reinventou uma linguagem rock para a guitarra eléctrica é hoje um ícone sagrado e são dele inúmeras canções que ouço desde sempre.
curiosamente, é pouco conhecido pelos azuis que escreveu e gostava de tocar, mas este é um daqueles que sabemos logo ser um clássico instantâneo...



que ao vivo era tocado assim:



There's a red house over yonder, that's where my baby stays
There's a red house over yonder, baby, that's where my baby stays
Well, I ain't been home to see my baby in about ninety nine and one half days
'bout time I see her

Wait a minute, something's wrong
The key wont unlock the door
Wait a minute, something's wrong, baby
The key wont unlock the door
I got a bad, bad feeling that my baby don't live here no more

I might as well go on back down
Go back 'cross yonder over the hill
I might as well go back over yonder
Way back yonder 'cross the hill, (that's where I come from)
'Cos if my baby don't love me no more
I know her sister will
















alcainça





12 fevereiro 2012







Soneto do amor total





Amo-te tanto, meu amor… não cante
O humano coração com mais verdade…
Amo-te como amigo e como amante
Numa sempre diversa realidade.


Amo-te afim, de um calmo amor prestante
E te amo além, presente na saudade
Amo-te, enfim, como grande liberdade
Dentro da eternidade e a cada instante.


Amo-te como um bicho, simplesmente
De um amor sem mistério e sem virtude
Com um desejo maciço e permanente


E de te amar assim, muito e amiúde
É que um dia em teu corpo, de repente
Hei-de morrer de amar mais do que pude.








Vinicius de Moraes
















cais de alcântara






11 fevereiro 2012






...e depois também há canções da minha vida em que não há palavras.
a história desta é conhecida: quando os pink floyd estavam a gravar o lendário “dark side of the moon”, tiveram a ideia de convidar alguém fora do grupo para improvisar vocalmente sobre um dos temas instrumentais.
alan parsons, à época um dos engenheiros do estúdio, apresentou-lhes clare torry, uma cantora praticamente desconhecida, a quem apenas sugeriram que trauteasse a melodia.
consta que, no final da gravação, a mesma miss torry não estaria nada segura do seu desempenho, e que teria até pedido desculpa por ter emitido uns gritos…
claro que o que ficou registado foi um dos mais extraordinários momentos da presença da voz humana numa canção.













Pensé morir, sentí de cerca el frío,
e de cuanto viví sólo a ti te dejaba:
tu boca eran mi día y mi noche terrestres
y tu piel la república fundada por mis besos.


En esse instante terminaron los libros,
la amistad, los tesoros sin tregua acumulados,
la casa transparente que tu y yo construimos:
todo dejó de ser, menos tus ojos.


Porque el amor, mientras la vida nos acosa,
es simplemente una ola alta sobre las olas
pero ay cuando la muerte viene tocar la puerta


hay sólo tu mirada para tanto vacío,
sólo tu claridad para no seguir siendo
sólo tu amor para cerrar la sombra.





Pablo Neruda














janelas de lisboa










fábulas de lisboa




vi. calçada do combro



( lê-se melhor aqui )




10 fevereiro 2012







cais da rocha











O mar




O mar. O jovem mar. O mar de Ulisses
E o daquele outro Ulisses que essa gente
Do Islão baptizou famosamente
O Sinbad do Mar. O mar de brisas
E ondas de Eric, o Vermelho, alto na proa,
E o daquele cavaleiro que escrevia
A epopeia e também a elegia
Da sua Pátria, em pântanos de Goa.
O mar de Trafalgar. O que a Inglaterra
Foi cantando na sua longa história,
O árduo mar que ensanguentou de glória
No diário exercício dessa guerra.
O incessante mar que numa linda
Manhã volta a sulcar a areia infinda.





Jorge Luis Borges












um desejo chamado eléctrico





09 fevereiro 2012







adoro esta canção, pela música e pelo acróstico da letra, uma variação brilhante sobre a mais célebre palavra de quatro letras.
sei a letra de cor e salteado, e é talvez a canção que mais canto (para dentro, já se vê) quando acordo mesmo bem disposto.
como acontece com todos os grandes standards, existem muitas versões, mas a de nat cole ainda é a melhor,



embora nos últimos anos a cover de john pizzarelli tenha vindo a marcar uma presença inigualável.




L is for the way you look at me
O is for the only one I see
V is very, very extraordinary
E is even more than anyone that you adore can

Love is all that I can give to you
Love is more than just a game for two
Two in love can make it
Take my heart and please dont break it
Love was made for me and you












jardim das amoreiras










Quando eu partir




Quando eu partir, quando eu partir de novo,
A alma e o corpo unidos,
Num último e derradeiro esforço de criação;
Quando eu partir...
Como se um outro ser nascesse
De uma crisálida prestes a morrer sobre um muro estéril,
E sem que o milagre lhe abrisse
As janelas da vida...
Então pertencer-me-ei.
Na minha solidão, as minhas lágrimas
Hão-de ter o gosto dos horizontes sonhados na adolescência,
E eu serei o senhor da minha própria liberdade.
Nada ficará no lugar que eu ocupei.
O último adeus virá daquelas mãos abertas
Que hão-de abençoar um mundo renegado
No silêncio de uma noite em que um navio
Me levar para sempre.
Mas ali
Hei-de habitar no coração de certos que me amaram;
Ali hei-de ser eu como eles próprios me sonharam;
Irremediavelmente...
Para sempre





Ruy Cinatti