30 outubro 2022







leituras  de  outubro






 


 


 


 


 






:: notas ::


 

quem me comeu a carne

francisca camelo

ed. nova mymosa

 

um pequeno livro que confirma uma das mais interessantes vozes da poesia actual. será um tanto desigual, com textos que nem sempre dão o que prometem, mas várias vezes vira-se uma página e ali está, o brilho imenso de um grande poema...

 

 


o rei-sombra

maaza mengiste

ed. tinta da china

 

estamos em 1935. as tropas italianas vão invadir a etiópia e uma trama de personagens que se cruzam desfila perante o nosso olhar, num fresco onde o épico e o romântico caminham lado a lado. a beleza do texto é magnética, alternando entre o realismo mais cruel e a emoção quase poética. e ficamos a conhecer o coronel exterminador fucelli, o soldado-fotógrafo navarra, o imperador selassie em fuga, o seu sósia minim (o rei-sombra), e muitos dos que combatem o invasor, sobretudo as mulheres, heroínas improváveis mas eficazes: hirut, aster, fifi, a cozinheira. escrito por uma das descendentes desses resistentes, esta é uma das novelas do ano.

 

 


how to pronounce knife 

souvankham thammavongsa

ed. bloomsbury

 

pequenos contos (brilhantes), narrados de um modo muito próprio por uma autora filha de refugiados do laos. neles estão sempre presentea o choque cultural e os inerentes problemas de linguagem e comunicação, mas felizmente alguma ironia e humor dão às histórias um gosto inesperado. uma boa surpresa.

 

 


before your memory fades

toshikazu kawaguchi

ed. picador

 

mais quatro episódios para a saga de um café onde é possível viajar no tempo (mas não no espaço) até que um café arrefeça. a escrita de kawaguchi mantém aquele peculiar encanto, por vezes quase poética. a primeira história é talvez das melhores de sempre.

 







26 outubro 2022


 


olha,

eu sei que não nos queremos

foram demasiadas

as noites de artilharia

mas hoje deitei-me

eram sete da tarde

acho que sonhei contigo

(não interessa)

acho que te vi ao longe na rua
(também não interessa) 
ouço ao fundo a ambulância

e penso se ainda estarás vivo

se existe algures num universo paralelo

a versão viúva de mim

mas a luz pousa na mesa

a tarde estaciona

mesmo frente à estante

e pergunto-me se saberei confessar

que perdi o livro que me ofereceste

é esse o meu favorito

e perdi-o

mas isto nunca conto a ninguém

como não conto do teu sorriso

a vinte e três de dezembro

chovia

o número da porta

eu desconhecia

havia uma festa algures

(e isto não interessa para nada

mas ainda hoje me pergunto

como é que eu não sabia)

porque a festa

eras tu.

 

 




Francisca Camelo







17 outubro 2022

 




o original é anterior e a gravação
que popularizou esta canção é a famosa
versão de ray charles. mas esta não lhe fica atrás.











13 outubro 2022

 

 

 



Luís Vaz.

de Camões,

chama que arde, não se desfaz,

sob o som plebeu das multidões.

E sobre o jogo ímpio do tempo,

jaz o poeta que a Pátria lembra.

 

 

 

 

Manoel Rodrigues-Leal

 

 





03 outubro 2022

 

 

 

Como  não  fazer  absolutamente  nada

 

 

 

Aluga uma casa perto da praia, ou uma cabana
mas: Não leves os teus sapatos de caminhar.

Não leves qualquer vestuário que vestisses

em algum lugar onde alguém te visse.

E não leves os teus recarregáveis.

Leva o Scrabble se tiver que ser,

mas não o dicionário e nenhum 

lápis para registar a pontuação.
Não leves um livro de culinária

ou alguma coisa para cozinhar.

Uma cana de pesca, vá lá,

mas jamais a linha,

o anzol, o chumbo,

deixa ficar tudo.

Descobre o

que ficou 

atrás.

 

 



Barbara Kingsolver





(tradução imperfeita minha)