‹‹ A morte de Emine atirou-me de cabeça para um vazio, como se o ramo a que estava agarrado se tivesse partido de repente. Esta perda abalou-me tanto, que nos primeiros tempos me pareceu uma coisa absolutamente sem sentido. Também não consegui perceber quão profundamente aquela morte me afectara. Tudo o que sentia era um peso terrível, negro, dentro de mim. Mas havia ainda outra coisa – uma sensação de libertação. A provação chegara ao fim. Emine não voltaria a morrer; não teria de voltar a passar por mais nenhuma doença. Na minha mente, ela iria permanecer como era. Sem dúvida que me esperavam outros terrores, que haveria outras catástrofes à minha espera. Mas o meu pior medo – o de perder Emine – desaparecera. Nunca mais tornaria a ver o mundo pelo prisma da sua doença ou da sua dor; nunca mais o medo subiria em mim ao ponto de asfixiar todo o meu ser.
O nosso lar fora destruído; deixado sozinho com dois filhos, perdi a vontade de trabalhar e, pior ainda, perdi toda a minha fé. Mas já não tinha medo. O pior que podia ter acontecido já acontecera. Agora era livre. ››
Ahmet Hamdi Tanpinar, in O instituto para o acerto dos relógios
Tão terrivelmente verdadeiro. Já senti algo semelhante e, ao mesmo tempo, a culpa, o medo de estar a ser insensível. Talvez seja mais comum do que pensamos.
ResponderEliminarBoas leituras.
boas leituras confinadas ;)
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