30 julho 2025

 






leituras  de  julho




 


 















:: notas :: 


 

poesia reunida

joão luís barreto guimarães

ed. quetzal

 

recolha fundamental para uma das vozes mais singulares da poesia actual (...e sim, pode julgar-se um livro pela capa!)


 

never let me go

kazuo ishiguro

ed. faber&faber

 

tem sido assim nos últimos tempos: vejo ou revejo o filme e, claro, dou por mim a reler passagens do livro.


 

on the calculation of volume II

solvej balle

ed. faber & faber

 

no segundo volume desta saga sobre o espaço e o decurso dos dias a protagonista continua presa indefinidamente no mesmo dia dezoito de novembro, mas tenta agora que pelo menos o espaço circundante se modifique. e assim dispõe-se a viajar, procurando locais onde esse mesmo dia - por alteração do clima - possa invocar uma estação diferente. uma bela reflexão sobre a dimensão do tempo.



venice : city of pictures

martin gayford

ed. thames&hudson

 

biografia-maravilha sobre uma cidade, com base nos seus quadros. não apenas com base nos artistas que ali nasceram e viveram, mas também em todos os que a visitaram e pintaram. no fim resulta uma espécie de história de arte circunscrita mas em que os detalhes e anedotas são universais. e - cereja no topo do bolo - muito bem escrita, informativa, formativa e divertida.


 

a estrada para oxiana

robert byron

ed. tinta-da-china

 

um clássico da literatura de viagens sobre uma expedição turística, e não só, até ao médio oriente. curioso como, noventa anos depois, algumas constatações socio-culturais sobre a palestina, o iraque, a pérsia e o afeganistão permanecem actuais.

 


iii

sérgio brota

ed. de autor

 

quase nos antípodas (não necessariamente geográficos) de “a estrada para oxiana”, ou talvez nem tanto assim, este é o conjunto de relatos de um viajante que caminha sobre solas de vento onde, em três viagens, acaba por importar mais o que se sente quando se observa do que aquilo que se vê quando se visita.

 






30 junho 2025

 





leituras  de  junho





















:: notas :: 


 

water, water

billy collins

ed. picador

 

lê-se a mais recente recolha de poemas de collins e fica-se com a sensação de que ele atingiu uma espécie de olimpo, em que tudo o que escreve parece luminoso para sempre. não é para todos.

 


changing my mind 

julian barnes

ed. notting hill

 

pequeno e luminoso ensaio sobre o que é isso de mudar de ideias, em capítulos dedicados a essa mudança em temas como a memória e os livros, as palavras e a idade. e barnes é sempre barnes. (lido no original por a edição nacional estar em acordês, novilíngua que não domino)

 


os elefantes são contagiosos

josé maría zonta

ed. língua morta

 

bela recolha de poemas de uma das vozes incontornáveis da poesia actual.

 


the militant muse

whitney chadwick

ed. thames & hudson

 

entre aventuras e desventuras amorosas surge a questão: será a musa militante surrealista? (boa pergunta). não sei, mas nos belíssimos capítulos dedicados às duas leonores (leonora carrington e leonor fini), a frida kahlo e jacqueline lamba e a lee miller e valentine penrose, quase ficamos com a certeza de que sim...

 


se eu quisesse, enlouquecia

joão pedro george

ed. contraponto

 

como todas as boas biografias de artistas, esta também remete para a velha e eterna dicotomia entre o autor e o homem, aquele quase sempre genial e transcendente, este banal e por vezes desprezável. gostei sobretudo dos relatos da passagem por angola e do que eram as tertúlias literárias nos cafés lisboetas. e depois, claro, as intermináveis invejas e guerrilhas entre capelinhas, a tacanhez do meio editorial lusitano e o retrato cru das intermináveis questões pessoais e familiares. no fim, salva(ra)m-se os poemas...

 


modern poetry

diane seuss

ed. fitzcarraldo

 

outra poeta a caminho do olimpo. este livro (dedicado às possíveis respostas a uma pergunta: poesia moderna, o que é isso?) é uma delícia. e merecia uma tradução em português são e escorreito.

 







30 maio 2025

 





leituras  de  maio


























:: notas :: 



le murmure

christian bobin

ed. folio

 

com pouco mais de cem páginas que se devoram num ápice, este é um pequeno-enorme livro. escrito em grande parte no leito do hospital onde veio a falecer, aqui fica o conjunto de pensamentos finais de um dos maiores poetas em prosa de sempre, a que cheguei tarde (mas ainda a tempo).


 

the world according to colour 

james fox

ed. penguin

 

belíssimo ensaio sobre o papel das cores na arte, na ciência, na filosofia, na cultura e na vida quotidiana da espécie humana ao longo dos tempos. o capítulo sobre o negro (a cor que não é cor) é uma pequena obra-prima.


 

proust - le dossier

jean-yves tadié

ed. folio

 

inspirado pela leitura recente do “dicionário de proust” fui reler partes (as publicadas por críticos e por escritores a propósito da “recherche”) deste curioso dossier sobre proust, assinado por um dos seus grandes biógrafos. à semelhança do pessoano, este é um labirinto onde gostamos de nos perder.

 

 

o livro de énio

carlos poças falcão

ed. officium lectionis

 

longo poema, quase místico, quase um cântico dos cânticos para o século xxi, em 888 oitavas (o número que resulta do somatório do valor das letras do nome de jesus escrito em grego), por vezes difícil de decifrar e onde se inscreve uma releitura dos evangelhos através das vivências, reais e esotéricas, de um grupo de amigos. toda uma experiência de leitura.


 

under the eye of the big bird 

hiromi kawakami

ed. grante

 

novela distópica, que resulta de contos interligados, passada num futuro talvez não tão improvável quanto parece. a humanidade enfrenta o perigo de extinção, não pela ecologia ou catástrofes, mas por algo bem mais simples e terrível: pela evolução natural já quase não nascem fêmeas. assim, somos todos réplicas genéticas cultivadas, sempre com algum defeito...


 

ao largo da vida 

rainer maria rilke

ed. ítaca

 

conjunto de contos curtos, escritos por um jovem rilke. alguns deles (“festa em família”, “o menino jesus”, “todas numa só”) são pequenas obras-primas. 

 


on the calculation of volume I

solvej balle

ed. faber & faber

 

ao princípio parece uma ideia importada de “groundhog day”, o filme em que bill murray acorda de manhã sempre no mesmo dia. aqui, porém, a protagonista (embora presa indefinidamente no mesmo dia dezoito de novembro) revive o dia de um modo contemplativo e filosófico, quase estóico, não se rendendo à armadilha do tempo. 

 






14 maio 2025

 



Não entres como turista no coração de uma mulher

 

a tirar fotos

deixando latas de cerveja

procurando só catedrais imensas

e estátuas transparentes

 

com a mochila cheia de mapas
e a fazer refeições rápidas

 

há um país

sete cidades

uma cordilheira e um inverno

no coração de uma mulher

 

não bebas só um copo de mar ali

 

não entres no avião

apanha o comboio da meia lua

não reveles ali as tuas fotografias numa hora

 

se não fizer demasiado frio

entra nu

 

não leves guarda-chuva

 

e sobretudo não cortes árvores

no coração de uma mulher

 

não costumam voltar a crescer.

 

 

 



José María Zonta






30 abril 2025

 




leituras  de  abril





 


 


 


 


 




:: notas :: 



a cadeira de mogno

maria f. roldão

ed. de autor

 

um dos problemas (frequentemente irresolúveis) com que se debate a poesia de carácter mais íntimo é conseguir ultrapassar a dificuldade em não cair no eroticamente óbvio, expectável e gratuito. estes poemas fazem-no com elegância e maestria. não é para todos.

 


os naufragistas

robert louis stevenson + lloyd osbourne

ed. tinta da china

 

não sei se será mesmo o melhor livro de stevenson, como dizia borges, mas seguramente anda lá perto. grande narrativa, que nos prende desde a primeira página.

 


frank : sonnets

diane seuss

ed. fitzcarraldo

 

é quase uma autobiografia, ilustrada por momentos, memórias e sentimentos em mais de uma centena de sonetos (que de soneto só têm o facto de conterem catorze versos). a autora nunca se perde aquele seu brilho confessional, cru e honesto - e este livro, belo, ganhou merecidamente um pulitzer.

 


no country for old men

cormac mccarthy

ed. picador

 

tem sido assim nos últimos tempos: vejo ou revejo o filme e, claro, dou por mim a reler passagens do livro.

 


the collected stories of… (volume four) 

philip k. dick

ed. gollancz

 

volume final desta recolha dos contos de dick, onde se destacam “the electric ant”, “oh, to be a blobel!”, e ainda o célebre “we can remember it for you wholesale”, adaptado ao cinema como “total recall”. foi uma viagem fascinante pelo reino da ficção científica, um universo a tentar explorar no futuro (salvo seja!)...

 


dicionário de proust

joão pedro vala

ed. quetzal

 

o começo de um livro é precioso. este, seguramente um dos melhores do ano, abre com uma magnífica frase, resplandecente e redentora: por decisão do autor, esta obra segue a grafia anterior ao acordo ortográfico de 1990. e depois, ao longo de 23 apaixonantes entradas (uma por cada letra do alfabeto), desenrola-se perante o nosso olhar um magnífico ensaio sobre a vida e obra de marcel proust, com natural ênfase na “recherche”, algo que nos faltava e não sabíamos.