novas cartas de marear
27 fevereiro 2025
it never rains
roger mcgough
ed. penguin
quem julga que a poesia não pode ser divertida devia ser castigado com leitura obrigatória de roger mcgough. aqui há pérolas como: “ * writer’s block * - the excitement i felt / as i started the poem / disappeared on reaching / the end of the fourth line. ”
the wind-up bird chronicle
haruki murakami
ed. vintage
antecessora de “1Q84” e de uma peculiar espécie de realismo mágico japonês, esta foi a novela em três partes que definitivamente pôs murakami no mapa. várias histórias que se cruzam, entre o tempo presente e o passado durante a guerra da manchúria, enquanto o pássaro de corda faz andar o tempo.
the vegetarian
han kang
ed. granta
novela-maravilha, tão bela quanto terrível, alegórica e sombria, quase kafkiana, que nos conta uma história de obsessão e desejo e a luta de uma mulher contra uma violência (externa e interna) que a impede de ser vegetariana - e depois vegetal... bastaria este livro para ter ganho todos os prémios (booker, nobel) que na verdade ganhou.
os imbecis
vv. aa.
ed. e-primatur
contos, histórias e poemas de algumas escritoras russas, injustamente esquecidas pelos cânones da literatura.
o ouriço e a raposa
isaiah berlin
ed. guerra & paz
partindo de um fragmento do poeta grego arquíloco - “a raposa sabe muitas coisas, mas o ouriço sabe uma coisa muito importante” - sob o nosso olhar é tecido um ensaio sobre a postura de tólstoi perante a história (ele, que era uma raposa a pensar que era ouriço... ou vice-versa?) e, entre outros, o dilema humano entre o monotismo e o pluralismo. brilhante.
the collected stories of… (volume three)
philip k. dick
ed. gollancz
este terceiro volume dos contos de dick contém pérolas como “sales pitch” (o triunfo da publicidade sobre a vontade?) e o famoso & cinematográfico “minority report” (custa a acreditar que foi publicado em 1956...)
31 janeiro 2025
manual de instruções para a morte
séneca
ed. v. s. editor
abrir o ano com as reflexões de lúcio aneu séneca, um estóico que nos ensinou que a morte é apenas uma parte da vida e que a devemos abraçar serenamente após uma vida plenamente vivida. excelente recolha de trechos das “cartas a lucílio” e das “consolações”, subordinados à ideia de que a inevitável morte apenas nos diz que devemos viver bem e não muito.
the shapeless unease
samantha harvey
ed. vintage
muito mais do que o diário de uma insónia prolongada...
los nombres que te he dado
josé mateos
ed. vandalia
cada vez gosto mais de poetas que o são sem o serem, que o mostram sem o quererem. este é um deles, e esta recolha da sua poesia ao longo dos últimos 40 anos valida a primeira frase. mateos é um daqueles que sabe que a linguagem nunca é suficiente para dizer o que sentem, e o que quer confessar jamais poderá ser dito com palavras. e que por isso escreve.
the collected stories of… (volume two)
philip k. dick
ed. gollancz
segundo capítulo de uma maratona distópica...
11 janeiro 2025
Estes poemas, disse ela
Estes poemas, estes poemas,
estes poemas, disse ela, são poemas
sem amor neles. Estes são os poemas de um homem
que abandonaria mulher e filho porque
faziam barulho no escritório. Estes são os poemas
de um homem que assassinaria a sua mãe para reclamar
a herança. Estes são os poemas de um homem
como Platão, disse ela, significando algo que eu não
compreendi mas que mesmo assim
me ofendeu. Estes são os poemas de um homem
que preferiria dormir consigo do que com mulheres,
disse ela. Estes são os poemas de um homem
com olhos como canivetes, mãos como as mãos de um
carteirista, poemas tecidos de água e lógica
e fome, sem nenhum fio de amor neles. Estes poemas
são tão cruéis quanto o canto dos pássaros, tão sem sentido
quanto folhas de olmo, os quais, se amarem, amam apenas
o amplo céu azul e o ar e a ideia
das folhas de olmo. O amor próprio é um fim, disse ela,
e não um princípio. Amar significa o amor
da coisa cantada, não da canção ou do canto.
Estes poemas, disse ela... Tu és, disse ele,
bela. Isso não é amor, disse ela com razão.
Robert Bringhurst
31 dezembro 2024
mortes fabulosas dos antigos
dino baldi
ed. cavalo de ferro
colectânea - vertida para português são e escorreito! (parabéns à editora) - de relatos de muitas mortes de inúmeras personagens, reais e mitológicas, povos, exércitos, cidades e outras entidades do mundo antigo, de um tempo em que a morte não era apenas o fim da vida e sim uma parte viva da vida. muitíssimo interessante.
revenge
yoko ogawa
ed. vintage
recolha de contos, alguns interligados (e quase todos muito bem conseguidos), que são uma boa introdução ao universo mágico e trágico de ogawa.
orbital
samantha harvey
ed. vintage
6 astronautas em missões científicas vivem confinados numa estação orbital. um deles recebe a notícia da morte da mãe e, naquele estranho mundo aparentemente imóvel mas à volta da terra a quase 30000 km/h, onde em 24 horas se experimentam dezasseis dias e dezasseis noites, a consciência de ser e observar um planeta azul à distância induz uma reflexão filosófica em todos eles... quase poético, ganhou o booker prize deste ano.
the grand equation
tom whlen
ed. black scat books
mais uma colecção-maravilha de micro-contos-feitos-poemas-em-prosa.
the city and its uncertain walls
haruki murakami
ed. harvill secker
a última novela de murakami é na verdade o retomar da primeira, que nunca tinha visto a forma de livro e que apenas aparecera numa revista. é a estreia da temática dos universos paralelos: a namorada de um rapaz desaparece misteriosamente, o que despoleta uma demanda que o conduz a uma cidade imaginária e a um emprego numa biblioteca onde por fim os dois mundos coalescem.
30 novembro 2024
kafka
nishioka kyodai
ed. pushkin press
nishioka kyodai é um famoso duo irmã-irmão que desenham manga. neste livrinho-maravilha ilustram à sua maneira, em algo que é muito mais do que uma novela gráfica, nove contos famosos de kafka. algumas destas adaptações são pequenas obras-primas.
bonecas
tom whalen
ed. cutelo
mais um livrinho-maravilha da cutelo, com poemas em prosa e micro-ficções, sempre em torno do universo das bonecas. magnético, divertido, por vezes assustador - tudo o que a literatura deve ser.
a corneta acústica
leonora carrington
ed. antígona
durante algum tempo (algures no milénio passado) leonora carrington era para mim apenas uma pintora surrealista. depois dei com este livro, que li numa velha edição da penguin, e pouco a pouco fui entrando na atmosfera do seu universo peculiar. esta é a história de uma idosa a quem uma amiga oferece uma corneta acústica, o que lhe permite ouvir a família a discutir planos para a sua transferência para uma espécie de asilo. porém, já internada, fica a perceber que nada ali é o que parece - e as suas experiências, que têm algo de autobiográfico, são um bom cartão de visita para o que é mais nuclear na sua obra. muito recomendável.
poesia quase toda
zbigniew herbert
ed. cavalo de ferro
toda a gente devia ser obrigada a ler este livro.
all the beauty in the world
patrick bringley
ed. vintage
devastado pela morte precoce do seu irmão de apenas 26 anos, o autor deixa o emprego e, angustiado perante a dureza e fealdade do mundo que o rodeia, procura refúgio junto de algo belo - e torna-se guarda no metropolitan museum of art, aquele museu clássico ni central park de nova-iorque. e este seu relato-memória dos vários anos em que ali trabalhou, repleto de curiosidades e histórias reais, constitui um excelente testemunho do que a arte pode fazer pela vida - mesmo quando a vida parece nada fazer pela arte.
um artista da fome
franz kafka
ed. e-primatur
reunião de histórias e fragmentos escritos durante os dois últimos anos de vida do autor. destaca-se naturalmente o conto “um artista da fome”, provavelmente um dos melhores alguma vez escritos e saúda-se a inclusão como preâmbulo da célebre carta escrita em julho de 1922 a max brod, e que termina com a definição de escritor segundo kafka: o bode expiatório da humanidade, que permite aos seres humanos o prazer sem culpa, quase sem culpa, de um pecado.
a kiss for the absolute
shuzo takiguchi
ed. princeton univ. press
recolha de poemas de quem introduziu o surrealismo nas letras japonesas.