numa noite de chuva, um pouco de céu na terra numa ária de handel pela voz superlativa de mlle. petitbon, que vou poder rever em abril.
Lascia ch'io pianga mia cruda sorte
E che sospiri la liberta
Lascia ch'io pianga mia cruda sorte
E che sospiri la liberta
E che sospiri
E che sospiri la liberta
Lascia ch'io pianga mia cruda sorte
E che sospiri la liberta
Il duolo infranga queste ritorte
De miei martiri sol per pieta
De miei martiri sol per pieta
Lascia ch'io pianga mia cruda sorte
E che sospiri la liberta
30 outubro 2015
Housekeeping observation
Under all this dirt
the floor is really very clean.
Lydia Davis
auto-retrato no inferno
edvard munch
29 outubro 2015
sou eu
sussurro
muito baixinho que gosto de ti. parece que não ouves, mas sentes. não é da voz
que me saem as palavras, é da alma e de mansinho, é a alma feita voz,
reivindicando a sua percentagem de condição humana. gosto de ti, e este gostar
envolve-te em pedacinhos de algodão, beija-te na testa, tacteia o teu rosto,
passeia as pontas dos dedos pela tua mão.
a minha alma
hoje dá-se os direitos do corpo, e quando estiveres a dormir, vai enroscar-se
nos teus braços, num aconchego morno. tu nem vais dar por ela, vais pensar que
é um sonho e sorrir. sou eu.
há dias "postei" uma fotografia de uma mesa posta (passe o pleonasmo...), à espera de amigos. e lembrei-me que se tivesse que escolher uma banda sonora para o momento, ela recairia sempre nesta balada clássica dos stones. o clip retrata um grupo de amigos que são músicos e vão tocar num bar, mas não faz justiça ao que parece sempre ausente: o saxofonista. e que na gravação em estúdio era nem mais nem menos que o grande sonny rollins, um dos gigantes do jazz. o solo original que improvisou ficou como um daqueles raros momentos mais-que-perfeitos.
Watching girls go passing by
It ain't the latest thing
I'm just standing in a doorway
I'm just trying to make some sense
Out of these girls go passing by
The tales they tell of men
I'm not waiting on a lady
I'm just waiting on a friend
A smile relieves a heart that grieves
Remember what I said
I'm not waiting on a lady
I'm just waiting on a friend
I'm just waiting on a friend
Don't need a whore
I don't need no booze
Don't need a virgin priest
But I need someone I can cry to
I need someone to protect
Making love and breaking hearts
It is a game for youth
But I'm not waiting on a lady
I'm just waiting on a friend
27 outubro 2015
fabulez
era uma vez duas vezes
e à terceira foi de vez…
26 outubro 2015
permanece aberta a controvérsia em torno da autoria deste "azul em verde". apareceu nesses dois grandes discos de 1959 (no "portrait in jazz" de bill evans e no "kind of blue" de miles davis) e ambos afirmaram na altura serem os autores do tema. apesar das muitas histórias que se contam, o mais lógico ainda parece ter sido evans o autor da melodia para piano (e o seu trio) e davis escrito o solo para trompete da sua versão, que já por aqui apareceu.
25 outubro 2015
“I’ve been working on the same Olympus
Typewriter since I was 16. All of my films were written on that typewriter, but
until recently I couldn’t even change the color ribbon myself. There were times
when I would invite people over to dinner just so they would change the ribbon.
It’s a tragedy.”
Woody
Allen
24 outubro 2015
[cais das colunas]
num barco no
rio
num barco no rio,
num barco subindo
o rio te peço
que amanhã não vás,
que não vás embora
deste rio minho,
que não te separes
do rasto do barco,
dessa ágil espuma,
do vento a passar
pelos teus cabelos
e do sol na cara,
nem de mim que te olho
nos olhos, pedindo.
há gente nas margens?
haverá, não sei.
há velas, motores,
arvoredos, ilhas?
há esquiadores?
pedregulhos, perigos,
sombras da boega?
é forte a corrente?
sei lá. sei que peço
fiques mais um dia
e não quero, não,
que te vás embora.
Vasco Graça
Moura
23 outubro 2015
[…is where the heart is, waiting on friends ]
22 outubro 2015
já fez quarenta anos esta colaboração de brian eno com phil manzanera - e a voz e percussão de robert wyatt. estas canções devem ter envelhecido mesmo bem porque há quem as ouça agora pela primeira vez e as considere "muito à frente" (ah estes teenagers…)
We are the 801
We are the central shaft
And we are here to let you take advantage
Of our lack of craft
Certain streets have certain corners
Sooner or later we'll turn yours
We are the 801
We are the central shaft
And thus throughout two years we've crossed the ocean
In our little craft (row, row, row)
Now we're on the telephone
Making final arrangements (ding, ding)
We are the 801
We are the central shaft
Looking for a certain ratio
Someone must have left it underneath the carpet
Looking up and down the radio
Oh, oh, nothing there this time
Looking for a certain ratio
Someone said they saw it parking in a car lot
Looking up and down the radio
Oh, oh, nothing there this time
Going back down to the rodeo
Oh, oh, oh, oh, oh, oh, oh, oh, here we go!
We are the table the captain's table let's get it understood
We are the losers we are the cruisers let's get it
understood
We are the diners the final diners let's get it understood
Most of us are tinkers, some of us tailors
And we've got candlesticks and lots of cocktail sticks
We saw the lovers the modern lovers and they looked very
good
They looked as if they could
We are the neighbors the nosy neighbors we think just like
you would
We think just like you should.
21 outubro 2015
marina abramovic
on subway train (new york, 2010)
martin schoeller
20 outubro 2015
fábula da
orla do mar
não consegui voltar
a ver no teu rosto os contornos da orla do mar
e nos teus olhos deixou de haver aquele brilho de espuma na praia
algo fez naufragar
em mim o sereno torpor da ondulação da tua pele
nas noites
despertas no sono que pairava sob um oceano de estrelas
perdeu-se o rumo
apenas adivinhado nas sonhadas cartas de marear
que outrora lia ou
julgava ler no pergaminho da nudez do teu corpo
submerso e turvo o
desejo de sempre aportar ao teu porto de abrigo
já nada me recorda
em ti a caravela mágica em que tanto naveguei
… apenas o silêncio
das conchas onde se ouvia a canção das ondas
19 outubro 2015
saunders
terrell nasceu na georgia e cegou aos dezasseis anos. impossibilitado de
trabalhar, aprendeu a tocar harmónica e, como sonny terry, veio a ser um dos
maiores virtuosos do instrumento, num estilo sincopado muito próprio. tornou-se lendária a sua associação com walter brown mcghee, nascido no tennessee e
vítima juvenil da poliomielite, que aprendeu a tocar numa guitarra caseira
feita a partir de uma lata de biscoitos. era uma vez dois inválidos que tocavam
azuis… o resto é história.
(este azul é aqui chamado "hootin' blues", mas também é conhecido por "whoopin' blues"; e este clip é todo um documento: num cenário idealizado para uma televisão de público maioritariamente branco - a casinha do cenário é um must - retrata-se com alguma veracidade o que poderia ter sido uma noite de música e dança algures no delta do mississippi)
18 outubro 2015
fui aos
perdidos e achados
minha
senhora disse-me o polícia
sua o
caraças senhora talvez
aqui não
recolhemos objectos dessa natureza
tão pouco
material
juraria ter
ouvido comercial
vá antes à
câmara municipal
serviço de
saneamento básico
resíduos
esgotos sarjetas
em suma,
escoamentos
coisa que
como podeis ler
não fiz nem
farei
se ele se
perdeu, compreendi afinal, foi porque quis
nunca se
deve contrariar um poema tão original
Bénédicte Houart
17 outubro 2015
[ alto dos moinhos ]
16 outubro 2015
No primeiro
dia que saí contigo
disseste que
o teu trabalho era estranho.
Mais nada.
Todavia, eu sentia
a pele a
rasgar-se como trapos
de cada vez
que me tocavas com a mão.
E os teus
olhos pareciam-me punhais
a fazer-me
doer os meus.
Daí para a frente
foi sempre a mesma coisa:
tu
orgulhavas-te da tua arte,
mais subtil
e directo em cada dia
e eu nunca
percebia nada.
Mas agora
sei.
Já conheço o
teu ofício:
Atirador de
facas.
A mais
certeira atiraste-ma ao coração.
Amalia
Bautista
15 outubro 2015
eu sei que disse que a grande beleza reside em momentos mais-que-perfeitos onde não cabem as palavras, por estar a pensar na versão do kronos quartet para o magnífico tema de vladimir martynov incluído na banda sonora de "la grande bellezza" (a que retorno vezes sem conta…) e que por aqui já apareceu. mas ditas em russo pelas vozes do sirin ensemble, as bíblicas bem-aventuranças adquirem um encanto inigualável e são - mesmo - um pouco de céu na terra. (mais curioso é ainda o facto de se conseguir copiar o texto bíblico do evangelho segundo são mateus (5, 3-12), colar no tradutor do google, seleccionar a língua russa e obter mesmo o texto cantado. e que começa com "blazhenny nishchiye dukhom"…)
14 outubro 2015
crianças e flores
rui chafes
13 outubro 2015
fábula do homem que tinha encontrado
um amor
falaram-me de um homem que tinha encontrado um amor.
disseram que não parecia contente, mas que a luz do sol o
atravessava como se fosse feito de vidro. o homem era
para
alguns invisível e um fantasma para outros. não se calava
e
falava com as plantas, ria-se para as flores e tinha sido
visto
a cantar com os pardais. também não se lhe conhecia outra
roupagem que não fossem poemas. saía à rua vestido com
versos e depois ficava sentado nos bancos dos jardins.
todos
o queriam ler. e alguém me disse que vivia assim porque
já
só escrevia, desde o dia em que tinha encontrado um amor.
12 outubro 2015
esta cover de um azul clássico (uma das pérolas de robert johnson) foi incluído
no disco de estreia de otis spann, lançado, um pouco tardiamente, em 1960. a letra foi modificada e o
ritmo também, num curioso jogo de cadências entre o piano de spann e a guitarra e voz de
robert lockwood.
I've got ramblin', I've got ramblin' on my mind
I've got ramblin', I've got travellin’ on my mind
I still love you pretty baby, but you treats me
so unkind
When i first met you baby, you
treated me like a king
When i first met you pretty baby, you
treated me just like a king
Yes we’ve been together so long until
my little love don’t mean a thing
That’s why I've got ramblin',
I've got travellin' on my mind
I've got ramblin', I've got ramblin' on my mind
Yes I still love
you pretty baby, but you treats me so unkind
I believe, I believe I’ll go back
home
I believe, I believe I’ll go back home
I just wanna tell the little girl who I’m in love with that she haven’t done me
wrong
I hate to leave my baby, standin’ in
the backdoor cryin’
I hate to leave my baby, standin’ in
the backdoor cryin’
Yes she done me so lowdown lately, I
got ramblin’ all on my mind
11 outubro 2015
“Ler para Borges era ouvir os comentários de Borges sobre
aquela leitura. Quando lemos para nós escolhemos os livros, damos uma certa
entoação ao texto, descobrimos coisas por nós, reflectimos sobre o que estamos
a ler. Nada disto acontecia quando eu lia para Borges. Estava apenas a
emprestar-lhe os meus olhos. A escolha do texto era dele, o tom era o dele e,
sobretudo, os comentários eram dele. Não era um acto colaborativo – era
simplesmente Borges. Ele dizia, “começa”, e eu lia duas linhas e ele
mandava-me parar e fazia um comentário, mas o comentário, ainda que fosse dito
alto, era para ele próprio, não para mim. Por isso tive esta estranha
experiência de ser a testemunha da leitura privada de alguém – e não era
qualquer um, mas um dos maiores leitores de todos os tempos. Isso foi um grande
privilégio”.