d e s c u b r a
a s
s e t e
d i f e r e n ç a s :
Portugal
Ó Portugal, se
fosses só três sílabas,
linda vista para
o mar,
Minho verde,
Algarve de cal,
jerico rapando o
espinhaço da terra,
surdo e
miudinho,
moinho a braços
com um vento
testarudo, mas
embolado e, afinal, amigo,
se fosses só o
sal, o sol, o sul,
o ladino pardal,
o manso boi
coloquial,
a rechinante
sardinha,
a desancada
varina,
o plumitivo
ladrilhado de lindos adjectivos,
a muda queixa
amendoada
duns olhos
pestanítidos,
se fosses só a
cegarrega do estio, dos estilos,
o ferrugento cão
asmático das praias,
o grilo
engaiolado, a grila no lábio,
o calendário na
parede, o emblema na lapela,
ó Portugal, se
fosses só três sílabas
de plástico, que
era mais barato!
Doceiras de
Amarante, barristas de Barcelos,
rendeiras de
Viana, toureiros da Golegã,
não há
"papo-de-anjo" que seja o meu derriço,
galo que cante a
cores na minha prateleira,
alvura arrendada
para ó meu devaneio,
bandarilha que
possa enfeitar-me o cachaço.
Portugal:
questão que eu tenho comigo mesmo,
golpe até ao
osso, fome sem entretém,
perdigueiro
marrado e sem narizes, sem perdizes,
rocim engraxado,
feira
cabisbaixa,
meu remorso,
meu remorso de
todos nós...
Alexandre
O’Neill
___________
Portugal
Portugal
Eu tenho vinte e dois anos e tu às vezes fazes-me sentir como se tivesse
oitocentos
Que culpa tive eu que D. Sebastião fosse combater os infiéis ao norte de África
só porque não podia combater a doença que lhe atacava os órgãos genitais
e nunca mais voltasse
Quase chego a pensar que é tudo mentira, que o Infante D. Henrique foi uma
invenção do Walt Disney
e o Nuno Álvares Pereira uma reles imitação do Príncipe Valente
Portugal
Não imaginas o tesão que sinto quando ouço o hino nacional
(que os meus egrégios avós me perdoem)
Ontem estive a jogar póker com o velho do Restelo
Anda na consulta externa do Júlio de Matos
Deram-lhe uns electro-choques e está a recuperar
àparte o facto de agora me tentar convencer que nos
espera um futuro de rosas
Portugal
Um dia fechei-me no Mosteiro dos Jerónimos a ver se contraía a febre do Império
mas a única coisa que consegui apanhar foi um resfriado
Virei a Torre do Tombo do avesso sem lograr encontrar uma pétala que fosse
das rosas que Gil Eanes trouxe do Bojador
Portugal
Se tivesse dinheiro comprava um Império e dava-to
Juro que era capaz de fazer isso só para te ver sorrir
Portugal
Vou contar-te uma coisa que nunca contei a ninguém
Sabes
Estou loucamente apaixonado por ti
Pergunto a mim mesmo
Como me pude apaixonar por um velho decrépito e idiota como tu
mas que tem o coração doce ainda mais doce que os pastéis de Tentugal
e o corpo cheio de pontos negros para poder espremer à minha vontade
Portugal estás a ouvir-me?
Eu nasci em mil novecentos e cinquenta e sete, Salazar estava no poder, nada de
ressentimentos
o meu irmão esteve na guerra, tenho amigos que emigraram, nada de
ressentimentos
um dia bebi vinagre, nada de ressentimentos
Portugal depois de ter salvo inúmeras vezes os Lusíadas a nado na piscina
municipal de Braga
ia agora propôr-te um projecto eminentemente nacional
Que fossemos todos a Ceuta à procura do olho que Camões lá deixou
Portugal
Sabes de que cor são os meus olhos?
São castanhos como os da minha mãe
Portugal
gostava de te beijar muito apaixonadamente
na boca
Jorge Sousa Braga