25 outubro 2019






fábula  para  jimi  hendrix 




na manhã seguinte ao dia em que fez dezasseis anos, após contar o
dinheiro recebido em prendas na véspera, deus apanhou o metro
e dirigiu-se ao centro comercial. entrou na loja de discos e por fim
decidiu comprar o álbum que há tanto tempo andava a namorar.
de regresso a casa fechou-se no quarto, removeu a rodela de vinilo
preto de dentro da capa cartonada, onde sobre a imagem daquelas
dezanove mulheres nuas se podia ler electric ladyland, e pousou-a
cuidadosamente sobre o prato do gira-discos. e depois, assim que
começaram a ouvir-se os primeiros riffs de voodoo child, deus fez
um gesto com a mão imitando james marshall hendrix, que num
velho poster pendurado na parede apontava a sua stratocaster na
direcção do público, e voltou a reparar que jimi tinha fechado os
olhos. cerrou os seus também e imaginou-se sobre aquele palco,
a tocar com ele, a ser ele até. então, empunhando uma guitarra 
imaginária e com o pé sobre um pedal wah-wah, deus sorriu de
felicidade. pela primeira vez na sua vida, sentiu que era imortal.






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