15 agosto 2019





primeiro: o coração



primeiro: o coração. se calhar dois (um para quando se morre outro para
a espera do milagre)
e o teu sorriso icónico
já perto de desaparecer:
há coisas que só depois percebemos que devíamos
ter roubado –
e mais tarde o que me
fica nas mãos,
demasiado íntimo
para carregar comigo enquanto faço as rotinas
na loja do costume e perguntam
como vai? e sei por
dentro que o teu sexo me ficou no cheiro,
por isso sorrio e genuinamente
respondo que
muito bem, cá se vai
andando
e sorrio de novo
no meu corpo o teu rasto
o arrepio de só há pouco
teres saído:
volta, estou tão perto
(se todas as noites me visitasses seria tão fácil morrer)
enquanto por dentro falo
calada
a dizer tanto
e o corpo, o corpo e o sorriso
que não voltei a ver,
o sexo
a namorada que guardas na gaveta
lá de casa quando apareço: mas primeiro sorrio primeiro faço as compras
da loja
do costume sorrio de novo
os morangos estão fora de época
o teu sexo numa estufa
as laranjas enormes,
com uma cor de encher
os olhos, mas primeiro,
o coração.
primeiro: o coração.




Francisca Camelo





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