30 janeiro 2019






fábula  para  rui  caeiro





também eu não sei para onde foram os malucos
que vinham pousar-te na mão, calculo que sintam
a tua falta, pairando em círculos e olhando para
baixo, tentando adivinhar para onde terias ido.
isto de nascer com algo a mais desconcerta toda
a gente que não sabe voar. e aqueles malucos só
desciam para se cruzarem contigo sem te verem.
talvez gostassem de pousar numa mão estendida
e apenas tu reconhecesses a sua solidão esquiva,
ou talvez esses loucos se deleitassem no voo, aves
fugindo de gaiolas alheias, sabendo que o pior é
já não poderem enlouquecer, ali parados no ar.
dizias que se morre de muita coisa, na realidade
um pouco todos os dias, sempre muito afinal, é
verdade, mas vive-se de pouca coisa, o essencial,
algo que soubeste o que era antes de todos nós.
agora e na hora da tua morte até eu me sinto um
maluco a pousar-te na mão. deixa-me ficar assim.





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