e é verdade. quinze meses após as “fábulas de lisboa” aventurei-me de novo a escrever um livrinho. e, em resumo, este consiste no recontar de alguns conhecidos mitos gregos clássicos (rapto de europa, minos e pasífae, teseu e o minotauro, a queda de ícaro…) dentro de uma espécie de biografia de dédalo, o conhecido inventor/arquitecto/engenheiro, para sempre ligado à concepção do labirinto de cnossos. é uma edição totalmente de autor, sem qualquer apoio de uma editora. estou orgulhoso do resultado.
e, claro, estão todos convidados para uma breve e indolor sessão de lançamento:
[o texto inclui uma "nota ao leitor" final, de onde retirei este pequeno excerto]
(…) e logo me ocorreu que a história poderia ser a do confronto
entre dois homens, e também que dédalo teria sido vítima
da sua
brilhante inteligência, por ser alguém preocupado
com
essa integridade interior, devotado à salvaguarda
não
apenas do seu espírito criativo mas também da liberdade
de
poder pensar por si, desejando proteger de tudo e todos
os seus
pensamentos mais profundos, o mais íntimo da alma.
e nisso
teria decerto sido muito semelhante a montaigne,
que consagrou
toda uma vida a observar-se, crítico de si
mas
vivendo-se em si e permanecendo sempre ele próprio,
passando
para o papel essa observação da condição humana,
fiel às
suas ideias e íntegro para com a sua consciência.
julguei
ainda possível que alguma da poesia oriental,
presente
mas dispersa e mascarada ao longo desta história
e que
muito mais tarde nos trouxeram kabir e tagore,
fosse
igualmente já conhecida na orla do mediterrâneo,
talvez
propagada por actores, arautos de uma tradição oral
num tempo
anterior ao do livro escrito, artistas que nas tragédias
gregas
souberam encontrar um veículo para nos contarem os mesmos
episódios,
e que tentei homenagear recriando de forma grosseira
os sumarentos
diálogos retratados nessas antigas peças teatrais.
e, mantendo
aberta a possibilidade de tudo imaginar,
creio
que perante a criatividade polifacetada de dédalo
jamais
o eterno labirinto da heteronímia pessoana
poderia
ser tomado como uma ambiguidade inconcebível,
e vim
descobrir um paralelo com aquele desconsolado
guarda-livros
que à sua maneira foi um ulisses moderno,
à
deriva por lisboa em busca de uma ítaca inatingível
e também ele um minotauro no
labirinto do seu desassossego. (…)