30 novembro 2014







Entre o sono e sonho,
Entre mim e o que em mim
É o quem eu me suponho
Corre um rio sem fim.

Passou por outras margens,
Diversas mais além,
Naquelas várias viagens
Que todo o rio tem.

Chegou onde hoje habito
A casa que hoje sou.
Passa, se eu me medito;
Se desperto, passou.

E quem me sinto e morre
No que me liga a mim
Dorme onde o rio corre —
Esse rio sem fim.






Fernando Pessoa







[os que gostam de efemérides, assinalarão que faz hoje setenta e nove anos que nos deixou. mas é mentira: 
ainda hoje passei à porta de sua casa, na rua coelho da rocha em campo de ourique, e vi-o nitidamente, a espreitar por uma janela]

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