09 outubro 2014






Requiem por um pássaro e um autocarro perdido





Mais um dia
em forma de pássaro morto.
Uma amálgama ainda quente
da manhã que nasce, espécie de beleza
desmanchada a que nem o nosso olhar
consegue servir de pietà. O vento
teima em agitar uma ou outra pena,
mas não há golpe de asa que o arranque
agora ao asfalto negro.


Partilhamos, no fundo, a impotência:
o destino que o esmagou
é o mesmo que esperamos para
embarcar sem surpresas, sem direito a atrasos.
A essa indiferença cansada prefiro
a do outro pássaro que, lá muito em cima,
hoje ainda mais, refaz a traços negros
a vida. É por esses instantes
de voo que aceito continuar a perder.







Inês Dias







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