soube agora
mesmo do seu desaparecimento. e estou triste. não o conhecia pessoalmente e em
termos de política não estávamos decerto de acordo sobre muita coisa, mas era
meu companheiro na luta contra a aberração do aborto ortopédico (não permitiu a
sua adoPção no ccb - e muito bem), escrevia com uma ironia rara, era um
belíssimo tradutor e, recordando palestras suas em que estive presente, não me
lembro de ninguém com a sua erudição e dimensão cultural (ouvi-lo falar de
camões era... brutal). e, sendo do porto, amava lisboa como poucos. quem dera ter sido eu a escrever isto:
o elevador
de santa justa
podes caber
à larga e não à justa no elevador de santa justa,
não te leva
a parte nenhuma no sentido utilitário normal,
mas é a
nossa torre eiffel. faz a experiência. por sinal
é um caso em
que não custa aprender à nossa custa:
variamente
na vida e na ascese se flibusta,
e aprender à
nossa custa é muito mais ascensional.
podes subir
ao miradouro se a altura não te assusta:
lisboa é cor
de rosa e branco, o céu azul ferrete é tridimensional,
podes subir
sózinho, há muito espaço experimental.
noutros
elevadores há sempre alguém que barafusta,
mas não
aqui: não fica muito longe a rua augusta,
e em lisboa
é o único a subir na vertical.
no tejo há a
barcaça, a caravela, a nau, o cacilheiro, a fusta,
luzindo à
noite numa memória intensa e desigual.
com o
cesário dorme a última varina, a mais robusta.
não é para
desoras o elevador de santa justa,
arrefece-lhe
o esqueleto de metal,
mas tens o
dia todo à luz do dia. não faz mal.
Vasco Graça
Moura
(1942 -
2014…(...
[elevador de santa justa]
Soube há pouco e, também não partilhando de todas as suas opiniões, fiquei com aquela tristeza de quem perde alguém próximo. Estranha coisa esta das afinidades.
ResponderEliminaré isso mesmo, carla... obrigado pela visita.
EliminarAs visitas são frequentes, mesmo que os comentários não dêem conta disso - não por falta do que comentar, só um estado de alma mais contemplativo e menos comunicativo da minha parte. (:
Eliminar;) (idem)
EliminarTambém não o conhecia pessoalmente, nem nunca tive a sorte de o ouvir, mas inspirava-me respeito e simpatia.
ResponderEliminar(Há dias, passei, repetidamente, pelo elevador. Não subi, porque a fila era extensa e não tive paciência para esperar. Talvez, quando regressar a Lisboa, sinta mais vontade de o fazer, inspirada pelas palavras do poeta.)
suba. a sério. só pela vista valeria a pena mas a própria viagem, dentro daquela gaiola de ferro, tem sempre algo de iniciático. e vai ver, aqueles poucos segundos de subida, mais tarde, irão parecer-lhe eternos ;)
EliminarEra um homem erudito, e com uma cultura enorme. Faz falta haver mais portugueses assim!!!
ResponderEliminarPoema bem lembrado :-)
;)
EliminarHá pessoas que deixam marcas únicas. :)
ResponderEliminaré isso mesmo.
EliminarConhecia-o de vista e do bom dia, boa tarde. Sempre agradável. Deixou a sua pegada no pó do tempo, bem vincada e deixou o tempo que passou escrito em palavras de futuro.
ResponderEliminarAplauso!
;)
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