31 maio 2013









nick cave
by anton corbijn














Não quero recordar nem conhecer-me.
Somos demais se olhamos em quem somos.
Ignorar que vivemos
Cumpre bastante a vida.

Tanto quanto vivemos, vive a hora
Em que vivemos, igualmente morta
Quando passa connosco,
Que passamos com ela.

Se sabê-lo não serve de sabê-lo
(Pois sem poder que vale conhecermos?),
Melhor vida é a vida
Que dura sem medir-se.








Ricardo Reis












30 maio 2013














chill october
john millais



















d e s c u b r a
a s
s e t e
d i f e r e n ç a s :





na aria "ombra mai fu"




a) pelo contra-tenor




b) pela mezzo-soprano




Ombra mai fu
di vegetabile,
cara ed amabile,
soave più.










29 maio 2013









Analfabeto






Conheço um homem
que lê todas as inscrições em pedras antigas
e que sabe
as gramáticas de todas as línguas, mortas ou vivas,
mas que não consegue ler
os olhos de uma mulher
que ele pensa que ama








Shadab Vajdi








(traduzido por mim a partir da tradução inglesa de Loftali Khaji)















helena christensen
by herb ritts










28 maio 2013









[from the gershwin songbook]
1.


The man who only lives for making money
Lives a life that isn't necessarily sunny
Likewise the man who works for fame
There's no guarantee that time won't erase his name

The fact is, the only work that really brings enjoyment
Is the kind that is for girl and boy meant
Fall in love and you won't regret it
That's the best work of all, if you can get it

Holding hands at midnight
'Neath a starry sky
Nice work if you can get it
And you can get it if you try

Strolling with the one girl
Sighing sigh after sigh
Nice work if you can get it
And you can get it if you try

Just imagine someone
Waiting at the cottage door
Where two hearts become one
Who could ask for anything more?

Loving one who loves you
And then taking that vow
It's nice work if you can get it
And if you get it, won't you tell me how?"

























[o resplandecente ascensor da bica]












27 maio 2013








Deslição de anatomia






Quase fui médico.
Cedo acreditei
ter inclinação.
Aconteceu, em menino,
frente aos compêndios escolares.
Fascinava-me,
no corpo humano,
o vocabulário em flor:
o suco gástrico,
o bolo alimentar,
o trânsito intestinal,
as papilas gustativas.

Ante o meu prematuro pasmo,
a professora vaticinou: vai ser médico!
Em casa, porém,
meu pai diagnosticou diverso:
não era a anatomia que me atraía.

Eu apenas amava as palavras.

Meu pai adivinhava.
E eu, de poesia, adoecia.











Mia Couto











[ nos anos vinte gravaram-se dois azuis, "black snake blues" de victoria spivey e também "black snake moan" de blind lemon jefferson, que se pensa estarem na génese deste "crawlin' king snake", registado primeiro por big joe williams, mas logo a seguir por john lee hooker, cuja versão é considerada a definitiva. tornou-se um clássico, e era igualmente um dos azuis favoritos de jim morrison e ray manzarek. ]








d e s c u b r a
a s
s e t e
d i f e r e n ç a s :






entre a crawlin' king snake de

a) john



e a de

b) jim and ray



Yes
You know I'm a crawlin' king snake baby and I rule my den
You know I'm a crawlin' king snake baby and I rules my den
Don't hang around my mate, wanna use her for myself

You know you caught me crawlin' baby when the
When the grass was very high
I'm just gonna keep on crawlin' baby until the day I die

Because I'm a crawlin' king snake baby and I rules my den
Don't hang around my mate, wanna use her for myself

You know you caught me crawlin' baby when the
When the grass was very high
I'm just gonna keep on crawlin' baby until the day I die

Because I'm a crawlin' king snake baby and I rule my den
Don't hang around my mate, wanna use her for myself

You know I'm gonna crawl up to your window, baby
Gonna crawl up to your door, you got anything I want, baby
Wanna crawl up on your floor

Because I'm a crawlin' king snake baby, yes, yes and I rule my den
Don't hang around my mate, wanna use her for myself

You know I'm gonna away now baby but
But I'll be back again, and when I come to town
Baby I'll be the same old snake again

Because I'm a crawlin' king snake baby and I rule my den
Don't hang around my mate, wanna use her for myself

Wanna use her for myself
























[jardins gulbenkian]









(ele há coisas sem explicação - e gente mal agradecida. esta árvore misteriosa suscitou uma dúvida ao autor da fotografia, que recorreu à ajuda da única pessoa que o poderia ajudar e que costuma andar por aqui. pensou-se num lingustrum, mais tarde num fraxinus ornus até que da douta especialista veio a solução: um cotinus coggygria, pois claro, só podia ser, também conhecida por árvore-do-fumo... e qual foi a paga do mal agradecido? ainda lhe tirou a clorofila...)


26 maio 2013








o menino miles dewey davis jr festeja hoje oitenta e sete risonhíssimas translações solares.
dizem por aí que não é visto desde noventa e um. mentira: passou toda a manhã comigo...


















Podíamos saber um pouco mais
da morte. Mas não seria isso que nos faria
ter vontade de morrer mais
depressa.


Podíamos saber um pouco mais
da vida. Talvez não precisássemos de viver
tanto, quando só o que é preciso é saber
que temos de viver.
  

Podíamos saber um pouco mais
do amor. Mas não seria isso que nos faria deixar
de amar ao saber exactamente o que é o amor, ou
amar mais ainda ao descobrir que, mesmo assim, nada
sabemos do amor.








Nuno Júdice








24 maio 2013














[ chiado ]















[ os echo and bunnymen gravaram esta canção duas vezes. 
a primeira apenas com os quatro elementos da banda. 
mais tarde voltaram ao estúdio com um convidado especial. ]









d e s c u b r a
a s
s e t e
d i f e r e n ç a s :








entre as duas versões de "bedbugs and ballyhoo"...



a) sem ray manzarek


b) com ray manzarek



Buffalo and bison 
bison and buffalo 
Cannonball and rifle 
Rifle and Cannonball 
that's the way the thunder rumbles 
that's the way the thunder rumbles 
Rumbles...
Down on your knees again 
Saying please again yeah yeah yeah 
Kangaroo and chipmonk 
Chipmonk and kangaroo 
Ballyhoo and bedbugs 
bedbugs and ballyhoo 
that's the way the bee bumbles 
that's the way the bee bumbles 
that's the way the bee bumbles 
that's the way the bee bumbles 
Bumbles...
Down on your kness again 
Saying please again no no no 
No 
Down on your knees again 
Saying please again 
Down on you knees again 
Saying please again no no no 
Buffalo and bison 
bison and buffalo 
Cannonball and rifle 
Rifle and Cannonball 
that's the way the thunder rumbles 
that's the way the thunder rumbles 











23 maio 2013








Se houvesse degraus na terra...





Se houvesse degraus na terra e tivesse anéis o céu,
eu subiria os degraus e aos anéis me prenderia.
No céu podia tecer uma nuvem toda negra.
E que nevasse, e chovesse, e houvesse luz nas montanhas,
e à porta do meu amor o ouro se acumulasse.

Beijei uma boca vermelha e a minha boca tingiu-se,
levei um lenço à boca e o lenço fez-se vermelho.
Fui lavá-lo na ribeira e a água tornou-se rubra,
e a fímbria do mar, e o meio do mar,
e vermelhas se volveram as asas da águia
que desceu para beber,
e metade do sol e a lua inteira se tornaram vermelhas.

Maldito seja quem atirou uma maçã para o outro mundo.
Uma maçã, uma mantilha de ouro e uma espada de prata.
Correram os rapazes à procura da espada,
e as raparigas correram à procura da mantilha,
e correram, correram as crianças à procura da maçã.









Herberto Helder






















office in a small city
edward hopper










22 maio 2013










a canção fantasma está aqui por causa de ray.
em bom rigor, esta não é uma música dos doors. foi escrita por ray e robbie muitos anos depois do grupo ter desaparecido, e foi pensada apenas como uma banda sonora para ilustrar poemas recitados por jim.
e por momentos parece que morrison voltou, que não chegou a partir. mas não... era só uma canção fantasma.
e agora volta a sê-lo de novo.



Awake.
Shake dreams from your hair
My pretty child, my sweet one.
Choose the day and choose the sign of your day
The day's divinity
First thing you see.

A vast radiant beach and cooled jeweled moon
Couples naked race down by it's quiet side
And we laugh like soft, mad children
Smug in the wooly cotton brains of infancy
The music and voices are all around us.

Choose they croon the Ancient Ones
The time has come again
Choose now, they croon
Beneath the moon
Beside an ancient lake

Enter again the sweet forest
Enter the hot dream
Come with us
Everything is broken up and dances.

Indians scattered, 
On dawn's highway bleeding
Ghosts crowd the young child's, 
Fragile eggshell mind

We have assembled inside, 
This ancient and insane theater
To propagate our lust for our life, 
And flee the swarming wisdom of the streets.

The barns have stormed 
The windows kept,
And only one of all the rest 
To dance and save us 
From the divine mockery of words,
Music inflames temperament. 

Ooh great creator of being 
Grant us one more hour, 
To perform our art 
And perfect our lives. 

We need great golden copulations,

When the true kings murderers 
Are allowed to roam free,
A thousand magicians arise in the land 
Where are the feast we are promised?

One more thing

Thank you oh lord
For the white blind light
Thank you oh lord
For the white blind light

A city rises from the sea
I had a splitting headache
From which the future's made