16 maio 2013









A imagem de vento






No princípio, desenvolveu a ideia de que o arco-íris era
uma ponte: aparecia sobre os barcos, no fim dos temporais,
e o marinheiro da gávea avistava uma mulher de cabelos
de ouro, agitados pelo vento, a atravessá-la; alguns desses
marinheiros enlouqueceram. Conheceu-os, durante os meses
em que estudou os costumes dos portos – sentavam-se à
parte, nas tabernas, e acendiam uma vela. Diziam que o brilho
da chama evocava os cabelos dourados dessa mulher; e
que o azul do álcool os fixava, como um olhar celeste.
Tentou, então, viver essa experiência: embarcou num velho
cargueiro e, durante dois ou três anos, percorreu os mares.
Mas nunca encontrou a deusa; nem os arco-íris formavam
o arco completo da ponte que imaginara. Também ele enlou-
queceu, e dizem que sobe ao telhado da casa, nas noites
de temporal, e grita pelo sol, a quem dá um nome de mulher;
até ficar rouco e o trazerem para o quarto. Aí, até
adormecer, murmura esse nome sem corpo, sem imagem, sem luz.







Nuno Júdice








 

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