14 dezembro 2017






O Escriba Acocorado




Sentado na pedra de ti próprio, 
não tens rosto, senão o que,
 
de anónimo, a ela afeiçoou
 
a mão que assim te quis. Do resto,
 
do que de individualidade, porventura,
 

em ti existiria, se encarregou
 
a persistente erosão dos dias. De vago,
 
neutro olhar sem órbitas, permaneces
 
hirto, fitando sempre mais além
 
da morna penumbra que te envolve
 

no halo intemporal que é, do tempo,
 
o nexo único. Nesse olhar
 
de não ver tudo se inscreve,
 
repensa e adivinha: teus limites
 
e, ainda, o que excederia tua humana
 

estatura. Sem contornos, em sombra
 
e sono te diluis no que, de ti,
 
nunca saberemos. Porém, límpida
 
e escorreita, até nós chega a laboriosa
 
escrita que no papiro ias lavrando.
 




Rui Knopfli






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