03 março 2015






fábula de bernardo soares






isso, ergue o olhar e fixa-te nos olhos que vês no espelho
tenta olvidar o peso do corpo nessa dorida mágoa de ser 
e escreve, força as palavras a escorrerem nuas do coração


obriga os dedos da tua mão a serem os braços de um delta
deixa as palavras fluirem livres, deixa-as desaguar no papel
ignora por um momento os irmãos que sabes sentir em ti


procura no mais fundo deles o sentimento que vos é comum
irás sempre vacilando entre esses alguns eus que sentes teus
mas deixa nascer as letras, deixa-as agrupar, molda-as assim


porque creio saberes de cor os versos que ouves todos os dias
e a amarra deixada sempre presa ao teu cais se o não fizesses:
nunca intuirias o que essas palavras te poderiam ter segredado


serias a sensação não vivida, aquela frase que ficou por escrever
a letra náufraga perdida num oceano de alfabetos por navegar
o livro que nesse teu vão sossego merecia ser desassossegado







6 comentários:

  1. Desta vês o José Luís esticou-se. Mas bem!
    Então, sai-lhe uma fábula em versão maxi e igualmente boa?! Ah, e gostei que o registo fosse um pouco diferente, pelo menos, foi assim que o assimilei.
    ("As terças são dias de fábulas minhas" - uma hipótese de etiqueta! - ou tem sido coincidência?)

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    1. ;)
      [normalmente são frutos de fim-de-semana e, como as segundas já são dias de azuis, aparecem pintadas no muro às terças]

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    2. ... corrijo o meu erro no comentário das 22h55. Claro que seria "vez" e não "vês".
      Que vergonha!
      (Muito cansaço.)

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    3. há "veses" que não vês ;)

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