27 maio 2014







fábula  da  primeira  vez





numa idade em que a música popular nos ocupa muita atenção, ela era diferente. não sabia nada dos grupos rock que idolatrávamos e só se interessava por música clássica. para além do liceu estudava também no conservatório, tinha um olhar misterioso e sabia tudo sobre história de arte. ouvia (mesmo) música contemporânea, e falava de dodecafonia e serialismo, palavras que eu nunca tinha ouvido. foi em casa dela que conheci cage e stockhausen (uma epifania). era tão diferente das outras raparigas que creio ter sido essa – para além do abismo daqueles olhos – uma das razões que me levou a querer conhecê-la melhor. ficámos amigos e com o tempo algo mais. uma tarde em que era suposto estarmos a estudar no seu quarto, cedemos à preguiça. ela foi à estante, tirou este album e pô-lo a tocar no gira-discos. deitados na cama a olhar para o tecto, ficámos a ouvi-lo de mãos dadas. e alguns minutos depois a minha primeira vez tinha acontecido. nem sempre sucede associada a uma música – mas por vezes sim. uma amiga confessou-me que, no seu caso, estava a tocar o “whiter shade of pale”. e um colega referiu o “riders on the storm” (grande escolha, por sinal). 
só não conheço mais ninguém que tenha por banda sonora da primeira vez o quinteto para clarinete de mozart.
















5 comentários:

  1. A minha foi ao som do Bolero de Ravel. A sua teve muito mais classe. :))))

    ResponderEliminar
  2. Que história!
    Bonita, forte, ternurenta... Apetece ler com cuidado com medo de estragar alguma coisa. E para beber tudo.
    Muito bom, José Luís!
    Isabel Pires

    ResponderEliminar
  3. Lembro-me do Stairway to Heaven... passou tanto tempo :):):)
    Likndo texto JL. A música complementa na perfeição.
    Beijo

    ResponderEliminar

cartografe aqui: