24 fevereiro 2012





Tisana 18.




Era uma vez uma cidade habitada por palavras em que cada uma vivia em sua casa com as portas fechadas mas constantemente se visitavam ou então saíam para a rua e passeando cruzavam-se com as outras palavras e saudavam-se mas com o crescimento progressivo da cidade as palavras quando saíam para a rua começavam a chocar umas com as outras e chocando-se retiravam-se encolerizadas e regressavam a casa mas já não regressavam como haviam saído e dentro de casa aumentavam por um efeito de cólera morosa e lembrando sempre as outras palavras começavam crescendo dentro de suas casas e da próxima vez que saiam para a rua já iam transformadas e quando encontravam outra vez as outras palavras passava-se outra vez a mesma coisa e regressavam a casa e continuavam a crescer e sempre em direcções diferentes e cresciam de tal modo que já não conseguiam fechar as portas e novos braços abriam as janelas e a cólera subia pelas paredes e começavam a escavar o tecto e ligadas ao andar de cima entrelaçavam-se à palavra do outro apartamento que também estava encolerizada e já chegava até ao telhado e subia pela antena de televisão e gritava encolerizada com as palavras dos outros prédios já subindo pelo céu acima e toda a cidade estava aos gritos e já não havia mais espaço para as palavras crescerem a não ser emaranhadas umas nas outras e os seus gritos confundiam-se e as palavras estavam todas unidas irremediavelmente e gritavam todas ao mesmo tempo de modo que ao longe era só um grito enorme que mais longe se transformava num sussurro e de muito mais longe até não se ouvia nada.





Ana Hatherly






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